quinta-feira, 14 de abril de 2016

O golpe é uma expressão da luta de classes


Ontem realizamos um debate na UFCG em que procuramos analisar "as várias faces do golpe". Coube a mim interpretá-lo sob o ponto de vista sociológico, o que fiz esposando a tese de que o golpe é, fundamentalmente, uma expressão da luta de classes no Brasil. Aqui faço um resumo de minha abordagem, disponibilizando os slides que apresentei no debate.

Parti da premissa de que, ao romperem com o formulário neoliberal, os governos trabalhistas de Lula e Dilma apresentaram resultados econômicos expressivamente melhores do que os governos que os antecederam (ver post anterior) e, implementando políticas públicas de forte impacto social, produziram o seu maior legado: um extraordinário processo de ascensão social.










Um aspecto importante deste processo foi que a ascensão social propiciou a abertura de espaços historicamente interditados aos chamados "excluídos", pois como bem definiram NERI e SOUSA (2012), esta foi a "década inclusiva", pois “a renda de grupos tradicionalmente excluídos que tinham ficado para trás foi a que mais prosperou no período, em particular, negros, analfabetos, crianças, nordestinos e moradores do campo”.










Isto incomodou nossa classe dominante, a chamada "elite branca", historicamente autoritária, segregacionista, conservadora, preconceituosa e exploradora, cujo arquétipo é a família patriarcal escravocrata. Por exemplo, passaram os ricos a torcer narizes frente à invasão de seus espaços "exclusivos" por pobres, negros, nordestinos e quetais. Como escreveu a socialite Danuza Leão "Ir a Nova York ver os musicais da Broadway já teve sua graça, mas, por R$ 50 mensais, o porteiro do prédio também pode ir, então qual a graça?"

Mas não foi só isso. Incomodaram-se muito com a ampliação dos direitos dos trabalhadores, notadamente a equiparação das empregadas domésticas à CLT, e com as políticas de renda mínima, como o Bolsa Família. Ora, está cada vez mais difícil encontrar mortos de fome que se submetem a qualquer salário e condições de trabalho para lhes servir como escravos. E isso, para a elite branca, o 1% da população, é inadmissível.






Assim, o golpe é apenas um instrumento da elite para "por ordem" na Casa Grande, e portanto, expressa tão somente a luta de classes.

Hoje leio o Veríssimo, em crônica lapidar (veja aqui), defender a mesma tese, dialogando com a História, "uma velha e pachorrenta senhora":

— Foi o fim da ilusão petista de mudar o Brasil?

— Mais, mais. Foi o fim da ilusão que qualquer governo com pretensões sociais poderia conviver, em qualquer lugar do mundo, com os donos do dinheiro e uma plutocracia conservadora, sem que cedo ou tarde houvesse um conflito, e uma tentativa de aniquilamento da discrepância. Um governo para os pobres, mais do que um incômodo político para o conservadorismo dominante, era um mau exemplo, uma ameaça inadmissível para a fortaleza do poder real. Era preciso acabar com a ameaça e jogar sal em cima. Era isso que estava acontecendo.

segunda-feira, 28 de março de 2016

O Brasil que os golpistas querem destruir


Em seu discurso de posse na presidência em 2003, Luís Inácio Lula da Silva fez uma afirmativa carregada do ethos de sua classe social: “se, ao final do meu mandato, todos os brasileiros tiverem a possibilidade de tomar café da manhã, almoçar e jantar, terei cumprido a missão da minha vida”[1]. Com essa fórmula aparentemente pueril, bastante ironizada pela grande mídia e pelas elites políticas que ele acabara de derrotar nas eleições de 2002, iniciava-se um novo ciclo de desenvolvimento econômico e social no Brasil que retirou 36 milhões de brasileiros da pobreza absoluta, propiciou a ascensão de 42 milhões à classe média – que passou de 37% para 55% da população entre 2003 e 2012 – e elevou a renda per capita em 78%[2].

Esse é um dos mais significativos movimentos de ascensão social e distribuição de renda já verificados na história do Capitalismo, denominado com bastante propriedade por NERI e SOUZA (2012) como “década inclusiva”, pois, “de maneira geral, a renda de grupos tradicionalmente excluídos que tinham ficado para trás foi a que mais prosperou no período, em particular, negros, analfabetos, crianças, nordestinos e moradores do campo” (NERI e SOUZA, 2012: 8; 21). Assim, “após 30 anos de alta desigualdade inercial, o que colocou o Brasil no imaginário internacional como a terra da iniquidade, o Índice de Gini começa a cair no Brasil, passando de 0,61 em 2001 a 0,527 em 2012” (NERI e SOUZA, 2012, p. 4; NERI et al., 2013, p. 10).

Com efeito, após a população experimentar o absoluto desastre do chamado “milagre econômico” da ditadura militar (1964-1985), que propiciou crescimento econômico, mas aprofundou a pobreza e a miséria no país e, em seguida à sua derrocada, os anos de hiperinflação que as agravaram ainda mais para, finalmente, após a estabilização monetária promovida pelo Plano Real no final do governo de Itamar Franco (1994), sentir os amargos resultados da “estratégia neoliberal”[3] do governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), imperava um profundo desânimo na população nacional, imersa num quadro econômico crítico.

Ora, em 2002 o Produto Interno Bruto do Brasil era de 1,488 trilhões de reais[4], ou 3,032 trilhões de reais em valores atualizados[5], o que colocava a economia nacional em 13º lugar em termos de grandeza no Mundo, quando esta ocupava o 9º lugar no início do primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, segundo dados do Banco Mundial[6]. A taxa de investimentos sobre o PIB chegou ao piso histórico de 15,3% em 2003 (BRASIL, 2013, p. 24), o PIB per capita montava em apenas R$ 8.364,46[7], ou R$ R$ 17.038,47 em valores atualizados[8], e a taxa de desemprego batia os 12,9%[9] no final do segundo governo do antecessor de Lula. A inflação fechou o ano de 2002 num patamar de 12,5%[10], bem longe do teto da meta estabelecida pelo governo (5,5%), e em aceleração. A dívida externa atingira R$ 231,7 bilhões em valores correntes[11], ou R$ 522,5 bilhões em valores atuais[12] e as reservas internacionais do país somavam, tão somente, US$ 37,8 bilhões (BRASIL, 2014) – dos quais US$ 20,8 bilhões correspondiam a um empréstimo feito junto ao FMI.

Na Era Lula-Dilma Rousseff, os números mudaram significativamente: o PIB cresceu 88%, atingindo a cifra de R$ 5,687 trilhões em 2014[13], o que guindaria a economia nacional ao 7º lugar em grandeza no Mundo[14]. O PIB per capita aumentou 60% no mesmo período, chegando a R$ 27.229,35 em 2014[15]. A taxa de investimentos sobre o PIB atingiu 19,7% em 2014[16], aumento de 20% em uma década, ao passo que o investimento do setor público em Formação Bruta do Capital Fixo passou de 2,6% do PIB em 2003 para 4,4% do PIB em 2012 (BRASIL, 2013, p. 7-8), aumento de 69%. De acordo com o Banco Central, o Brasil tornou-se superavitário em sua dívida externa em 2006[17] e, segundo o Tesouro Nacional, o país apresentava um superávit de R$ 1,13 trilhões em novembro de 2015[18]. As reservas internacionais montam a US$ 371,5 bilhões em fevereiro de 2016[19], quase dez vezes mais do que em 2002.

Em virtude das mais de 20 milhões de novas vagas de emprego abertas em uma década (BRASIL, 2014; IBGE, 2014), o país atingiria sua menor taxa histórica de desemprego em dezembro de 2014 (4,3%)[20] e fecharia 2015 com uma taxa média anual de 6,9% que, comparada com a taxa de 12,9% verificada no final do governo de Fernando Henrique Cardoso (2002), evidencia uma redução absoluta de 6 pontos percentuais, isto é, uma queda de 53% do desemprego no período dos governos trabalhistas.

Refutando as teses neoliberais quanto ao papel do Estado na economia e numa clara opção estratégica de crescimento econômico sustentável por meio da ampliação do mercado interno, então por décadas represado, os governos de Lula da Silva e Dilma Rousseff empreenderam uma série de políticas públicas inovadoras, destacando-se, por um lado, as políticas de inclusão social e distribuição de renda por meio de programas como o Fome Zero e o Bolsa Família e, por outro, as políticas de estímulo à geração de empregos e de aumento real do salário mínimo, que teve um ganho real de 80% entre 2002 e 2016, passando a corresponder a 2,12 cestas básicas em janeiro de 2014, contra 1,42 no último ano do governo de Fernando Henrique Cardoso (DIEESE, 2013, p. 10)[21]. Em virtude disso, e dos outros avanços já citados, a renda familiar per capita elevou-se de R$ 679,90 em 2002 para R$ 1.052,00 em 2014[22], aumento de 41%, e, segundo a ONU/PNUD, a proporção de pobres despencou 86%, saindo de 25,5% em 2000 para 3,5% em 2010.


É este novo Brasil que os derrotados nas eleições de 2014 querem destruir por meio de um golpe.




[2]Discurso da presidenta Dilma Rousseff na abertura do VII Encontro Empresarial Brasil-União Europeia - Bruxelas/Bélgica em 24/02/2014. Disponível em http://www2.planalto.gov.br/centrais-de-conteudos/videos/dilma-discursa-na-abertura-do-vii-encontro-empresarial-brasil-uniao-europeia, acesso em 12/05/2015.
[3]Segundo CARINHATO (2008, p. 40), “Esta estratégia tinha o seguinte receituário: combate à inflação, através da dolarização da economia e valorização das moedas nacionais, associado a uma ênfase na necessidade de ajuste fiscal. Junto dessas orientações, ainda podemos citar a reforma do Estado – mormente privatizações e reforma administrativa – desregulamentação dos mercados e liberalização comercial e financeira”.
[4]Banco Central do Brasil, Sistema Gerenciador de Séries Temporais. https://www3.bcb.gov.br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do?method=prepararTelaLocalizarSeries, acesso em 05/02/2016.
[5]A valores de 31/12/2014, deflacionados pelo IGP-DI da Fundação Getúlio Vargas.
[8]A valores de 31/12/2014, deflacionados pelo IGP-DI da Fundação Getúlio Vargas.
[9]IBGE, Séries históricas da Pesquisa Nacional de Emprego. http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/trabalhoerendimento/pme_nova/defaulttab_hist.shtm, acesso em 05/02/2016.
[10]IBGE, Índice de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA. http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/precos/inpc_ipca/defaultinpc.shtm, acesso em 25/08/2014.
[11] Tesouro Nacional, Séries Temporais. http://www3.tesouro.fazenda.gov.br/series_temporais/principal.aspx#ancora_consulta, acesso em 05/02/2016.
[12] A valores de 31/12/2015, deflacionados pelo IGP-DI da Fundação Getúlio Vargas.
[13]Banco Central do Brasil, Sistema Gerenciador de Séries Temporais. https://www3.bcb.gov.br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do?method=prepararTelaLocalizarSeries, acesso em 05/02/2016. Até o fechamento deste artigo, o BCB ainda não havia divulgado o valor do PIB de 2015.
[16] IBGE, Séries Históricas e Estatísticas. http://seriesestatisticas.ibge.gov.br/series.aspx?no=12&op=0&vcodigo=SCN36&t=taxa-investimento, acesso em 05/02/2016. 
[17] Banco Central do Brasil, Sistema Gerenciador de Séries Temporais. https://www3.bcb.gov.br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do?method=prepararTelaLocalizarSeries, acesso em 05/02/2016.
[18] Tesouro Nacional, Séries Temporais. http://www3.tesouro.fazenda.gov.br/series_temporais/principal.aspx#ancora_consulta, acesso em 05/02/2016.
[19]Banco Central do Brasil, https://www.bcb.gov.br/?RESERVAS, acesso em 05/02/2016.
[20]IBGE, Séries históricas da Pesquisa Nacional de Emprego. http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/trabalhoerendimento/pme_nova/defaulttab_hist.shtm, acesso em 05/02/2016.
[21] “A lo largo de los ocho años de Gobierno del Presidente Lula da Silva (2003-2010), el salario mínimo creció 5.8% en promedio anual, con un incremento real acumulado de casi 60%. En este mismo periodo, el PIB aumentó 4% al año en promedio, mientras que el PIB per cápita lo hizo a un ritmo de 2.3%. El resultado ha sido un crecimiento del salario mínimo por encima de la expansión real del PIB, desencadenando efectos redistributivos importantes y contribuyendo a la reducción de los niveles de pobreza. Este crecimiento es casi el doble del observado en el periodo del Gobierno del Presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002): incremento real del salario mínimo de 3.3% al año, mientras el PIB creció 2.3% y el PIB per cápita 0.8%”. (OIT, 2011, p. 79).
[22] IBGE, 2014acesso em 05/02/2016.

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

A Feira de Campina Grande em Dois Tempos, por Roberto Coura.




A Prefeitura Municipal de Campina Grande, por meio da Secretaria de Planejamento, presta uma homenagem à cidade em seu Sesquicentenário rendendo um preito à Feira Central. Estamos reeditando o cultuado "A Feira de Campina Grande", ensaio fotográfico de Roberto Coura que veio à luz em 1978, e também estamos publicando o inédito "As Cores da Feira", com fotos realizadas por ele agora em 2014.

O lançamento será no próximo dia 18/12, às 20 horas, no Museu de Arte Popular da Paraíba, conhecido como "Museu dos Três Pandeiros". Todos estão convidados!!


quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Paradoxos da Cidadania à Brasileira


Acaba de ser publicado na Revista História e Cultura o meu artigo "Paradoxos da Cidadania à Brasileira: sociologia histórica do campo jurídico no Brasil", um dos capítulos, revisado e atualizado, de minha Tese de Doutorado.

Partindo da perspectiva analítica da sociologia histórica, o ensaio tem como objetivo demonstrar que a cidadania no Brasil, cingida pela desigualdade, tem um sentido peculiar e paradoxal. Daí, o designativo “à brasileira”. Forjado nos alvores da formação nacional, esse aspecto contraditório permanece incólume no âmbito do campo jurídico no Brasil, mesmo diante das transformações sociais, políticas e econômicas experimentadas pela sociedade brasileira no transcurso de sua história. O ensaio procura reconstituir a configuração do estatuto da desigualdade civil no Brasil Colonial analisando o código legal coevo (as Ordenações Filipinas), bem como as práticas nas arenas jurídicas para demonstrar que, em função de sua recorrência estrutural até os dias de hoje, ele é um traço perene da cidadania à brasileira.

Ora, não é preciso ser um cientista social para saber que a desigualdade se constitui no mais grave problema nacional, pois é notório o fato de que a distribuição de renda no Brasil é uma das mais iníquas do mundo. De fato, embora na última década a pobreza e a miséria tenham declinado constante e substancialmente no país, levando a proporção de pobres a decrescer de 25,5% da população em 2000 para 3,5% em 2010 (BRASIL, 2014, p. 17), a desigualdade brasileira está entre as doze mais altas do mundo (NERI e SOUZA, 2012, p. 3). 

O que torna ainda mais perversa essa realidade é que, para além da brutal desigualdade econômica entre os poucos que possuem muito e os muitos que possuem pouco, há uma flagrante falta de equidade entre os cidadãos no acesso às salvaguardas que o Estado deveria outorgar a todos, pois a sociedade brasileira está emoldurada por um sistema hierárquico de relações sociais que define condições diferenciais de cidadania de acordo com a posição do indivíduo num panorama social dividido entre “superiores” e “inferiores”, como ressalta Roberto DaMatta (1983, 1987 e 1993)

Assim, a desigualdade social no Brasil tem uma dupla face: por um lado, existe uma diferença econômica aguda entre a minoria abastada e a massa despossuída; por outro lado, há um verdadeiro abismo civil entre a elite e o povo. 

O mais paradoxal é que o "estatuto da desigualdade" pauta, até hoje, o exercício da justiça no Brasil, com sua inacreditável estrutura recursal propiciando a impunidade dos que têm dinheiro para pagar advogados e os seus calabouços infectos para os “peixes pequenos” e os “ladrões de galinha”. Este é o tema focado no ensaio.

Acesse o artigo completo aqui.

A Revista

Revista História e Cultura (ISSN: 2238-6270), classificada pela CAPES na categoria Qualis A2, o segundo estrato de qualidade mais elevada, é uma publicação semestral eletrônica editada pelo Programa de Pós-Graduação em História da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais (FCHS) da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), com sede na cidade de Franca, São Paulo, Brasil.

A História e Cultura, atenta às pesquisas e ao debate acadêmico desenvolvido na História e em áreas afins, publica textos inéditos de autoria de doutores, mestres e pós-graduandos stricto sensu, redigidos em português, espanhol, francês e inglês. Além de artigos para dossiês, a revista recebe contribuições em fluxo contínuo de artigos livres, entrevistas, resenhas e traduções.


quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Uma agenda para o desenvolvimento de Campina Grande


Por força constitucional, as despesas públicas no Brasil devem estar previstas em Planos Plurianuais (PPA), instrumentos de planejamento a médio prazo que estabelecem as diretrizes, objetivos e metas da administração pública para um período de quatro anos nos níveis federal, estadual e municipal. O PPA instrui a elaboração anual da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que estabelece metas e prioridades para o próximo exercício administrativo, a qual orienta a elaboração da Lei Orçamentária Anual (LOA), que define os recursos necessários para as ações da LDO.

Elaborado pelo Executivo e submetido ao Legislativo no primeiro ano de uma gestão, o PPA não é apenas um diploma legal, mas se constitui, sobretudo, num instrumento de orientação estratégica por meio do qual o governo procura compatibilizar a gestão com o seu programa eleitoral e, no caso dos municípios, com os planejamentos federal e estadual, de maneira a otimizar a captação de recursos. É também um instrumento de eficiência administrativa e transparência pública, pois mostra aonde o governo quer chegar num documento formal que articula objetivos, metas, programas, projetos e ações, estabelecendo prioridades programáticas e de ação para o futuro face às receitas. É, ainda, um dispositivo para o dinamismo do ciclo de gestão, pois a articulação entre suas quatro grandes fases – elaboração, implantação, monitoramento/avaliação e revisão – permite acompanhar o desempenho do governo e corrigir rumos quando necessário. Assim, o PPA deve estar inserido em um processo participativo de elaboração, acompanhamento de sua implementação e de correção de rumos, de maneira que a população possa interferir democraticamente nos planos e ações governamentais.


Em artigo publicado no e-book Campina Grande hoje e amanhã (leia aqui) apresentamos as linhas mestras do Plano Plurianual 2014-2017 de Campina Grande, Lei Municipal 5.411 de 30/12/2013, elaborado sob a coordenação da Secretaria de Planejamento (SEPLAN) em parceria com as Coordenadorias de Gestão (COOGES) e do Orçamento Participativo (OP), num processo amplamente democrático que envolveu a realização de doze audiências públicas e duas plenárias do OP.


Por meio do PPA 2014-2017 o governo Romero Rodrigues apresenta à população sua visão de futuro para o município, materializada numa audaciosa proposta de crescimento econômico para Campina Grande, que vem pautada pelo compromisso com o desenvolvimento humano, a sustentabilidade ambiental e a boa governança. Seus objetivos, metas, programas e ações revelam a clara disposição do Executivo municipal em agir firmemente para a melhoria de vida da população, promovendo o engrandecimento da cidade vis-à-vis sua fundamental vocação histórica de “capital do trabalho”.


Numa “sociedade da informação”, onde a população tem amplo acesso às ações efetivas empreendidas pelos governos, podendo participar irrestritamente em fóruns virtuais, institucionais e na mídia, este artigo pode servir como um pequeno guia para os cidadãos e cidadãs campinenses acompanharem e cobrarem do governo a efetivação do Plano Plurianual, atuando como sujeitos ativos do destino de Campina Grande.



In Campina Grande hoje e amanhã. [Livro Eletrônico]./ Antonio Guedes Rangel Junior; Cidoval Morais de Sousa. 2. ed. Campina Grande: EDUEPB, 2013. 1500kb - 184p. il. color. ISBN: 978-85-7879-170-4 (leia aqui)

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Identidade e Qualidade de Vida nos Territórios da Cidadania na “Década Inclusiva” Brasileira

Disponibilizo em meu perfil no Academia.edu artigo apresentado no IX Congresso da Associação Latino Americana de Sociologia Rural (ALASRU), realizada na cidade do México, entre 06 e 10 de outubro. Transcrevo o resumo:

A primeira década do século XXI foi extremamente promissora para o Brasil, particularmente no que tange à redução das desigualdades sociais e à melhoria da qualidade de vida da população. Segundo o instituto oficial de estatística, depois de 30 anos de alta desigualdade inercial, o Índice Gini começa a cair em 2001, passando de 0,61 naquele ano para 0,527 em 2012. Pesquisadores têm definido esse período como “década inclusiva”, pois, de maneira geral, a renda de grupos tradicionalmente excluídos foi a que mais prosperou, em particular, negros, analfabetos, camponeses e nordestinos. Considerando que as políticas públicas de desenvolvimento rural empreendidas pelo governo federal a partir de 2003, especialmente o Plano Safra da Agricultura Familiar e o Programa Territórios da Cidadania, foram fundamentais para esse processo, este trabalho visa, em primeiro lugar, avaliar seus efeitos sobre a qualidade de vida da população do campo no Brasil, analisando os Índices de Qualidade de Vida (ICV) apurados em uma amostra de 37 Territórios da Cidadania localizados nas 5 regiões brasileiras, estimados mediante a visita de 27 equipes de entrevistadores a 10.106 domicílios rurais situados em 16 estados da Federação. Em segundo lugar, procura correlacionar, por meio de análise estatística, o ICV com indicadores de identidade territorial, também apurados na pesquisa nacional, de maneira a avaliar se a “força” da identidade camponesa tem algum poder explicativo no processo de evolução da qualidade de vida nos Territórios da Cidadania.

Leia o artigo completo aqui e a apresentação aqui

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

O Brasil Neoliberal e o Brasil do PT

Em seu discurso de posse no primeiro mandato o presidente Lula disse: “se, ao final do meu mandato, todos os brasileiros tiverem a possibilidade de tomar café da manhã, almoçar e jantar, terei cumprido a missão da minha vida”. Com essa fórmula aparentemente pueril, bastante ironizada pela grande mídia e pelas elites políticas que ele acabara de derrotar nas eleições de 2002, iniciava-se um novo ciclo de desenvolvimento econômico e social no Brasil que, em onze anos, retirou 36 milhões de brasileiros da pobreza absoluta, propiciou a ascensão de 42 milhões à classe média – que passou de 37% para 55% da população entre 2003 e 2012 – e elevou a renda per capita mediana das famílias brasileiras em 78%[1].

Este é um dos mais espetaculares movimentos de ascensão social e recuperação econômica já verificados na História, denominado com extrema propriedade por NERI e SOUZA (2012) como “década inclusiva”, pois, “de maneira geral, a renda de grupos tradicionalmente excluídos que tinham ficado para trás foi a que mais prosperou no período, em particular, negros, analfabetos, crianças, nordestinos e moradores do campo” (NERI e SOUZA, 2012: 8; 21). Assim, “após 30 anos de alta desigualdade inercial, o que colocou o Brasil no imaginário internacional como a terra da iniquidade, o Índice de Gini começa a cair no Brasil, passando de 0,61 em 2001 a 0,527 em 2012” (NERI e SOUZA, 2012, p. 4; NERI; VAZ; SOUZA, 2013, p. 10):


De fato, após a população experimentar o absoluto desastre do chamado “milagre econômico” da ditadura militar (1964-1985), que propiciou crescimento econômico, mas aprofundou a pobreza e a miséria no país e, em seguida à sua derrocada, os anos de hiperinflação que as agravaram ainda mais para, finalmente, após a estabilização monetária promovida pelo Plano Real no final do governo de Itamar Franco (1994), sentir os amargos resultados da “estratégia neoliberal”[2] do governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), imperava um profundo desânimo na população nacional, imersa num quadro econômico crítico.
Ora, em 2002 o Produto Interno Bruto do Brasil era de US$ 504,359 bilhões[3] (BRASIL, 2013, p. 16), o que colocava a economia nacional em 13º lugar em termos de grandeza no Mundo, quando esta ocupava o 9º lugar no início do primeiro mandato de FHC, segundo dados do Banco Mundial. A taxa de investimentos sobre o PIB chegou ao piso histórico de 15,3% em 2003 (BRASIL, 2013b, p. 24), o PIB per capita montava em apenas US$ 2.800[4] (BRASIL, 2013, p. 16) e, segundo o IBGE, a taxa de desemprego batia os 12,9% no final do governo de Fernando Henrique Cardoso. A inflação fechou o ano de 2002 num patamar de 12,5% (IPCA), bem longe do centro da meta estabelecida pelo governo e em aceleração, enquanto a dívida externa atingira US$ 165 bilhões e as reservas internacionais do país somavam, tão somente, US$ 37,8 bilhões (BRASIL, 2014) – dos quais US$ 20,8 bilhões correspondiam a um empréstimo feito junto ao FMI – enquanto a dívida líquida do setor público havia subido para 51,3% do PIB[5].

Na Era Lula-Dilma Rousseff, os números mudaram significativamente: o PIB cresceu 46%, atingindo a cifra de US$ 4,838 trilhões em 2013 (BRASIL, 2013, p. 16), o que guindaria a economia nacional ao 7º lugar em grandeza no Mundo, de acordo com o Banco Mundial. O PIB per capita aumentou 29% no mesmo período, chegando a US$ 24.065 (BRASIL, 2013, p. 16). A taxa de investimentos sobre o PIB atingiu 18,4% (BRASIL, 2013b, p. 24), aumento de 20% em uma década, ao passo que o investimento do setor público em Formação Bruta do Capital Fixo passou de 2,6% do PIB em 2003 para 4,4% do PIB em 2012 (BRASIL, 2013b, p. 7-8), aumento de 69%.

Segundo o IBGE, a inflação fechou o ano de 2013 em 4,7% e, de acordo com o Ministério da Fazenda, o Brasil zerou sua dívida externa em 2007, apresentou, no início de 2014, uma dívida externa líquida de -US$ 92,7 bilhões e as reservas internacionais atingiram o montante de US$ 376,5 bilhões em 2013, dez vezes mais do que em 2002:


Em relação à dívida pública, esta caiu de 60,4% do PIB em 2002 para 35,7% em 2013 (BRASIL, 2013b), redução de 41%:



Em virtude das mais de 20 milhões de novas vagas de emprego abertas em uma década (BRASIL, 2014 e 2014b, p. 16), o país atingiria sua menor taxa histórica de desemprego em dezembro de 2013 (4,3%), cifra que, comparada com a taxa de 12,9% verificada no final do governo de Fernando Henrique Cardoso (2002), evidencia uma redução absoluta de 8,6 pontos percentuais, isto é, uma queda de 67% do desemprego no período dos governos trabalhistas.


Refutando as teses neoliberais quanto ao papel do Estado na economia e numa clara opção estratégica de crescimento econômico sustentável por meio da ampliação do mercado interno, então por décadas represado, os governos de Lula da Silva e Dilma Rousseff empreenderam uma série de políticas públicas inovadoras, destacando-se, por um lado, as políticas de inclusão social e distribuição de renda por meio de programas como o Fome Zero e o Bolsa Família e, por outro, as políticas de estímulo à geração de empregos e de aumento real do salário mínimo, que teve um ganho real de 72,31% entre 2002 e 2014 (DIEESE, 2013, p. 4), passando a corresponder a 2,12 cestas básicas em janeiro de 2014, contra 1,42 no último ano do governo de Fernando Henrique Cardoso (DIEESE, 2013, p. 10). Segundo a OIT,


Durante os oito anos de governo do Presidente Lula da Silva (2003-2010), o salário mínimo cresceu, em média, 5,8% ao ano, com um aumento real acumulado de quase 60%. Durante este mesmo período, o PIB aumentou 4% ao ano em média, enquanto o PIB per capita evoluiu a uma taxa de 2,3%. O resultado foi um aumento do salário mínimo acima do crescimento real do PIB, provocando grandes efeitos redistributivos e contribuindo para a redução dos níveis de pobreza. Este crescimento é quase o dobro que o observado no período de governo do presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002): aumento real no salário mínimo de 3,3% ao ano, enquanto o PIB cresceu 2,3% e o PIB per capita 0,8%. (OIT, 2011, p. 79, tradução nossa).


Em virtude disso e de outros avanços, a renda familiar per capita elevou-se de R$ 679,90 em 2002 para R$ 961,60 em 2013 (BRASIL, 2014), aumento de 41%, e, segundo a ONU/PNUD, a proporção de pobres despencou 86%, saindo de 25,5% em 2000 para 3,5% em 2010. Segundo a ONU,

No Brasil, os esforços iniciados em 2003 resultaram em processos participativos e de articulação institucional  que produziram políticas que efetivamente reduziram a pobreza e a fome. (...)  O Brasil já conseguiu atingir as duas metas propostas pela ONU para 2015: a do Milênio, que inclui diminuir pela metade a quantidade de pessoas que vivem com menos de US$ 1,25 por dia e que passam fome; e a da Conferência Mundial de Alimentação, de diminuir pela metade o número de pessoas desnutridas. (ONU/FAO, 2014, p. 20-25).




Em suma, os números oficiais e de organismos internacionais demonstram limpidamente as consequências para a população dos dois projetos hoje em disputa pela Presidência da República no Brasil:





[1] Discurso da presidenta Dilma Rousseff na abertura do VII Encontro Empresarial Brasil-União Europeia - Bruxelas/Bélgica em 24/02/2014.
[2] Segundo CARINHATO (2008, p. 40), “Esta estratégia tinha o seguinte receituário: combate à inflação, através da dolarização da economia e valorização das moedas nacionais, associado a uma ênfase na necessidade de ajuste fiscal. Junto dessas orientações, ainda podemos citar a reforma do Estado – mormente privatizações e reforma administrativa – desregulamentação dos mercados e liberalização comercial e financeira”.
[3] US$ 3,323 trilhões a preços de 2013, segundo o Banco Central.
[4] US$ 18.641 a preços de 2013, segundo o Banco Central.
[5] BARBOSA, Nelson; SOUZA, José Antonio Pereira de. “A inflexão do governo Lula: política econômica, crescimento e distribuição de renda”. In SADER, Emir; GARCIA, Marco Aurélio, Brasil entre o passado e o futuro. São Paulo, Editora Fundação Perseu Abramo; Boitempo, 2010, p. 59.