segunda-feira, 9 de abril de 2012
quarta-feira, 21 de março de 2012
O Salto Quântico da UFPB
Com este segundo post retomo a série de quatro artigos alusivos aos 10 anos da UFCG e 60 anos da Escola Politécnica de Campina Grande (POLI).
Leia o primeiro post sobre a história da UFCG aqui
Os cientistas naturais chamam de “salto quântico” um fenômeno que ocorre
quando uma partícula ganha energia: o movimento dos elétrons se acelera e eles
se afastam do núcleo, “pulando” de um nível atômico para outro. Esse conceito
que revolucionou a Física e cujas aplicações resultaram em invenções como o controle
remoto e o CD, serve de metáfora para processos em que um grande investimento
de energia humana provoca saltos evolutivos repentinos e irreversíveis em uma
instituição ou organização. Foi o que aconteceu com a UFPB no reitorado de Lynaldo
Cavalcanti (1976-1980).
Em quatro anos, o ex-diretor da Escola Politécnica de Campina Grande
transformou a universidade, colocando-a entre as maiores do Brasil, com sua
inédita estrutura multicampi.
Expandiu e interiorizou, fundando os campi de Bananeiras, Patos, Sousa e
Cajazeiras e criando 33 cursos de graduação, 18 de mestrado e dois de doutorado.
Até então, a pós-graduação da UFPB se resumia a três cursos de mestrado em
engenharia, todos funcionando, coincidentemente ou não, na própria POLI. É
desse período a federalização da Faculdade de Medicina de Campina Grande,
episódio saborosamente relatado pelo próprio Lynaldo na biografia escrita por
Ivan Rocha Neto:
“Consegui federalizar a faculdade de Medicina de
Campina Grande, como Ney Braga [então ministro da Educação], dizia – ‘com mão de gato’,
isto é, em lugar de uma lei do Congresso, a Universidade Federal criou o curso
de medicina, absorveu os professores da antiga faculdade, recebeu como doação o
patrimônio e os alunos foram transferidos para a Universidade Federal. Isso foi
uma verdadeira maluquice e um artifício muito trabalhoso”.
Outros tempos, outros costumes. Mas, para quem gostava de citar Lester
Korn –“a liderança visionária e não a capacidade administrativa será o modelo
mais valioso para o executivo de amanhã” – essa foi apenas mais uma manobra
genial do já mítico reitor, como foi a aquisição do IBM 1130 (leia aqui).
Com a instalação de mais de 20 núcleos interdisciplinares, como os ainda
ativos NUPPA, NDHIR e NEPREMAR, a universidade trilhava os caminhos da
excelência na pesquisa e extensão, sem deixar de lado as artes e a cultura, que
tiveram um grande fomento com a criação do NUDOC, a construção do Teatro Lima
Penante e a parceria com o governo do Estado para a formação da Orquestra
Sinfônica da Paraíba.
Naquele reitorado, a UFPB se cosmopolitizou em virtude de uma política
agressiva de convênios e intercâmbios. Para se ter uma idéia, no final da década
de 70, o Centro de Ciência e Tecnologia (CCT) do Campus II contava com 102
professores estrangeiros, entre indianos, canadenses, franceses, alemães e
ingleses. Em plena ditadura militar, a universidade se politizava com a nomeação
de professores de alto nível, muitos deles de esquerda, alguns voltando do
exílio e outros saindo do ostracismo forçado pelo regime de exceção. A criação
da Associação dos Docentes (ADUF) é fruto deste processo.
Ao final de seu mandato, Lynaldo Cavalcanti pôde relatar ao CONSUNI que
o alunado evoluíra de 11.301 para 21.120 estudantes e que o número de
diplomados duplicara. Que de 963 professores em 1976, a UFPB passara a ter 2.635
em 1980, com um aumento exponencial de doutores e mestres. Que o corpo
técnico-administrativo crescera de 1.640 para 3.360 funcionários. Que o
orçamento da UFPB havia dobrado e seu patrimônio triplicado. Era o “gigantismo”
dos sete campi que faria a fama da UFPB, mas que também levaria ao seu
desmembramento em 2002. Mas essa é outra história.
quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012
As Origens da UFCG
Em 2012 a UFCG comemora
duas datas importantes: seus 10 anos de criação por desmembramento da UFPB e os
60 anos de fundação da Escola Politécnica de Campina Grande (POLI), primeira
escola superior da cidade, conquista da sociedade civil campinense, mobilizada pelo
lendário Edvaldo do Ó.
A POLI foi criada em 1952
pelo governador José Américo de Almeida e viria a constituir, juntamente com
outras nove escolas superiores isoladas, a Universidade da Paraíba, também criada
por José Américo em 1955. A Universidade Estadual seria federalizada por
Juscelino Kubitschek, no apagar das luzes de seu prolífico governo,
transformando-se na UFPB, com três campi: João Pessoa, Campina Grande e Areia.
Desde então, o Campus II
da UFPB, que reunia a POLI e a FACE (Faculdade de Ciências Econômicas)
protagonizaria episódios de vanguardismo, espírito criativo e empreendedorismo
público na constituição do “campo” do ensino superior, da ciência e da
tecnologia na Paraíba, a começar pela construção da sede da Escola Politécnica,
projetada e executada por um “Escritório Técnico” formado por professores e
estudantes do curso de Engenharia Civil, criado em 1954. A inauguração do
edifício que hoje abriga o Centro de Humanidades da UFCG, em 1962, coincidiu
com a criação do curso de Sociologia e Política, que daria um tom de
engajamento e espírito crítico ao campus campinense, numa época efervescente da
vida nacional. A criação do curso de Engenharia Elétrica em 1963 inaugurou uma
tradição de excelência nessa área reconhecida nacional e internacionalmente
ainda hoje, principalmente após a criação do Mestrado em 1970.
Em 1968, um lance ousado
do diretor da POLI, o visionário Lynaldo Cavalcanti, viria a alçá-lo como uma
das principais lideranças da UFPB. Contra a vontade do reitor-interventor
Gillardo Martins, nomeado pelo governo militar, mas apoiado pela comunidade
universitária, pela sociedade campinense e assessorado pela ATECEL, fundada em
1967 para este fim, Lynaldo adquiriu um IBM 1130 para o Campus II, o primeiro mainframe do Norte e Nordeste e quinto
do Brasil, sem contar com um centavo sequer do orçamento da universidade,
valendo-se apenas dos fundos angariados por professores, funcionários e
estudantes.
Este ato de um dos maiores empreendedores públicos que a Paraíba já conheceu é um símbolo da tradição e da essência da UFCG e foi um prenúncio de seu futuro reitorado, que promoveria o primeiro "salto quântico" da UFPB, através de um extraordinário processo de expansão e interiorização. Mas essa é outra história.
Correio da Paraíba, 9 de fevereiro de 2012 (página A6)
quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012
UEPB: AUTONOMIA E PARTIDARIZAÇÃO
Por Hermano Nepomuceno
Em
junho de 2009, o governo do Estado anunciou o realinhamento do orçamento
e reduziu em 17 milhões de reais a dotação da UEPB. O secretário de
Planejamento, em entrevista à imprensa, declarou que “esse recurso fica
contingenciado, ela não vai perder um Real... até o final do ano, ela terá de
volta”. A reação foi rápida: Reitoria, Assembleia Legislativa do Estado, Câmara
de Vereadores de Campina Grande, Sindicatos de professores e funcionários,
diretório e centros acadêmicos, com repercussões em todos os setores da
imprensa anti-maranhista. Ao perceber o estrago político, o governador decidiu
rever o corte e, posteriormente, o secretário Ademir Melo foi substituído.
Mas, em 24 de agosto de 2010, em plena campanha
eleitoral, ao participar do ciclo de debates com os candidatos a governador
pela Associação Comercial de Campina Grande, o candidato José Maranhão
declarou: “eu acho que é inteiramente viável fazer a federalização da UEPB...”.
Dois dias depois, no mesmo palanque, o candidato Ricardo Coutinho detonou:
“Maranhão, desde sempre, tentou se livrar da UEPB... é um governo que não
compreende a importância de se ter uma universidade estadual... uma postura de
tentar a todo momento... combater a autonomia... ou então se livrar dela”,
hipotecando ainda “apoio ao manifesto publicado ontem pela Associação dos
Docentes da UEPB”. Desnecessário recordar que a comunidade universitária se
consolidou como o maior cabo eleitoral do candidato Ricardo, depois do ex-governador
Cássio, claro. A principal faixa de rejeição e resistência ao candidato
Maranhão espraiava-se nas camadas médias e entre os eleitores de nível
educacional superior. A imagem de
“inimigo de Campina” foi cristalizada. Enquanto em João Pessoa Ricardo Coutinho
teve 59,4%, em Campina alcançou 64,2% dos votos válidos!
Voto é uma decisão que gera consequências. Desde 2011,
jogando seu discurso campinense na lata do lixo, o governador Ricardo vem
contingenciando as transferências orçamentárias para a UEPB : quase dez vezes
mais do que a tentativa do governador Maranhão no longínquo ano de 2009. Agora,
os golpes finais contra a Autonomia Universitária: a redução dos níveis de
repasse (comprometendo o processo continuado de expansão da Universidade) e o
comando das contas correntes (estabelecendo o controle financeiro sobre as
ações da Direção da UEPB). A reitora Marlene sintetizou, de forma pragmática e
conceitual, a nova realidade: “Hoje vivemos a mercê da vontade do governador,
ele manda quanto quer e como quer”! E ainda: “foi rasgada a Lei de Autonomia da
UEPB”!.
Para além da
revisão-agora-do conceito de “autonomia” externada pelo governador nas suas
twittadas, o jornalista Arimateia Sousa, em sua coluna “Aparte”, desta
quarta-feira, constatou que “as pretensões políticas (de) Marlene têm imposto à
instituição... um desvirtuamento de seu projeto acadêmico”. E acusa de
partidarização com “a desmedida entronização da militância do PC do B nas
decisões e na estrutura da UEPB”. A crítica vai além, e há acusações quanto à
cooptação de lideranças eleitorais e até lança suspeição sobre o processo
sucessório universitário.
Antes de mais nada, duas preliminares precisam ser
destacadas. Primeiro, o governador Coutinho refugou o seu próprio discurso de
campanha e traiu quem lhe apoiou por conta dele. Segundo, a Autonomia
Universitária foi ferida no seu essencial. Isto posto, como ativista e como
observador da cena política campinense, creio que há fundamentos de verdade nas
críticas da coluna “Aparte”.
Mas a crítica à partidarização política e à
instrumentalização eleitoral só tem validade agora? Só é válida contra o
pequeno PC do B?
Em 2004 e 2008 a partidarização e a instrumentalização
beneficiaram o PSDB. E em 2010 foi a vez do PSB se beneficiar.
As observações do jornalista
Arimateia, muito perspicazes, podem nos levar a refletir sobre o
aperfeiçoamento de mecanismos de controle extra-corporativos. Mas não podem nos
desviar do central neste momento: o exacerbado autoritarismo governamental
desta gestão que está quebrando a instituição da Autonomia.
sexta-feira, 23 de dezembro de 2011
UFCG outorga título de Professora Emérita a educadora belga Ghislaine Duqué
Ghislaine Duqué, durante atividade no Projeto Universidade Camponesa da UFCG. |
Nesta terça-feira, 20, o Colegiado Pleno do Conselho Universitário da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) aprovou a outorga do título de Professora Emérita a Ghislaine Duqué, por sua “relevante e reconhecida contribuição ao estudo da Agricultura Familiar Camponesa no Brasil e competente e dedicada docência no curso de Ciências Sociais do Centro de Humanidades”.
A sua militância intelectual e prática em prol do desenvolvimento sustentável do Semiárido e da inclusão produtiva e cidadã das populações pobres do campo, na coordenação de diversos projetos de pesquisas e movimentos sociais, foi um dos pontos destacados pelo propositor do título, professor Márcio Caniello (diretor do Centro de Desenvolvimento Sustentável do Semiárido/UFCG).
“A história de vida dessa grande humanista que, criança, sentiu os rigores da Grande Guerra em sua pátria de origem, a Bélgica, e que no início dos anos 1970 optou por transferir-se para o Brasil para ser alfabetizadora de adultos no interior do Piauí, precisava ser reverenciada pela UFCG”, comentou Caniello.
A propositura do título foi feita ao Colegiado Pleno do Conselho Universitário após aprovação nos Conselhos Administrativo (CONSAD) e de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPE) do Centro de Desenvolvimento Sustentável do Semiárido (CDSA).
Ghislaine Duqué – É especialista em Sociologia do Desenvolvimento pela Universidade de Sorbonne (Paris I), doutora em Sócio-Economia do Desenvolvimento pela Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais (EHESS, Paris), Pós-Doutora pela Universidade de Paris X (Nanterre), Pesquisadora 1C do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) desde meados dos anos 1980 e Líder do Grupo de Pesquisa Produção Agrícola Familiar (GPAF), o qual fundou em 1995 e atualmente encontra-se certificado pela UFCG.
Desenvolveu atividades no Centro de Humanidades da UFCG, no Curso de Ciências Sociais de forma competente e dedicada (no qual teve orientanda de PIBIC laureada em 1997 com o Prêmio Jovem Pesquisador) e, especialmente, no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (PPGCS), onde é reconhecida pelos seus pares como uma das principais lideranças acadêmicas que por ali passaram e onde ainda participa como professora voluntária. Ela foi coordenadora do Programa por duas gestões, orientou e participou de diversas bancas examinadoras de teses de Doutorado e dissertações de Mestrado. Atuou como membro do Colegiado do Curso, em Comissões de Seleção e do Conselho Editorial da Revista Raízes desde 1984, dentre inúmeras outras atividades.
Participou como ativista na construção de redes como a Articulação do Semiárido (ASA) e na atuação voluntária em Organizações Não-Governamentais, como o Programa de Aplicação de Tecnologias Apropriadas às Comunidades (PATAC), associação sem fins lucrativos fundada em 1971 em Campina Grande, da qual foi dirigente por mais de 20 anos e em cuja gestão como presidente, foi agraciada com os Prêmios NEAD de Estudos Agrários, Fundação Banco do Brasil de Tecnologia Social (2001) e Prêmio Banco Mundial de Cidadania (2002).
Acesse aqui a proposta de outorga do título de Professora Emérita
(Rosenato Barreto – NJC/CDSA com Marinilson Braga - Ascom/UFCG)
quarta-feira, 21 de dezembro de 2011
Um Novo Paradigma para o Desenvolvimento Sustentável do Semiárido
Até bem
recentemente, o Brasil adotava uma estratégia de desenvolvimento rural voltada
quase exclusivamente para o fomento da agropecuária empresarial, tendo como
meta principal a maximização da produtividade nesse setor. Embora tenha
apresentado resultados importantes, como o significativo aumento da produção
agropecuária nacional e sua influência decisiva nos superávits da balança
comercial nos últimos anos, essa estratégia resultou praticamente inócua no que
se refere à solução dos problemas sociais que caracterizam o meio rural
brasileiro, particularmente a concentração fundiária e a falta de emprego e
renda que expulsam o trabalhador do campo e deixam sem perspectiva de futuro os
milhares de jovens camponeses de cuja “opção de ficar” na terra natal depende,
realmente, a continuidade e o futuro da unidade produtiva familiar. Por isso,
essa estratégia foi batizada de modernização conservadora.
Os dilemas sociais,
econômicos e ecológicos da modernização conservadora há muito têm sido
denunciados no debate sobre o desenvolvimento rural brasileiro, discussão que
se intensificou com a emergência dos movimentos sociais e das organizações da
sociedade civil no Brasil após o fim do regime militar. Esse debate levou a
pelo menos um consenso entre estudiosos, atores sociais e governo: a
importância crucial da chamada agricultura
familiar camponesa para o desenvolvimento rural, especialmente em virtude
do seu extraordinário potencial na geração e manutenção de emprego e renda no
campo, o que confere a ela um papel estratégico no contexto da região semiárida
nordestina, onde é amplamente majoritária.
O reconhecimento da
agricultura familiar foi um passo muito importante no quadro do desenvolvimento
rural brasileiro, principalmente porque levou à criação de políticas públicas
específicas voltadas para ela, cujo alcance, aliás, teve um crescimento
exponencial a partir do Governo Lula, como se pode verificar na evolução do
Plano Safra da Agricultura Familiar, que cresceu 572% em relação ao Governo FHC,
saindo de um total de R$ 2,4 bilhões (safra 2002/2003) para R$ 16
bilhões (safra 2010/2011), o que
permitiu que o número de contratos avançasse de 890 mil para mais de 2
milhões/ano safra.
Entretanto,
verifica-se que muitos produtores familiares não conseguem acessar esses
recursos por falta de informações, conhecimentos e assistência técnica. Além do
mais, há grandes dificuldades em se desenvolver novas tecnologias e analisar e
difundir as muitas experiências bem sucedidas de desenvolvimento promovidas
pelos movimentos sociais e organizações civis da região, pois as instituições
públicas, como as universidades e os institutos de pesquisa, mantêm-se
distantes da população. Isso acaba por dificultar a interação que deveria
ocorrer entre a comunidade técnico-científica e a população rural, o que
promoveria uma importante troca de práticas e conhecimentos na construção de
estratégias realmente sustentáveis para o desenvolvimento local.
Assim, é preciso
construir um novo paradigma de desenvolvimento para o semiárido brasileiro por
intermédio de processos de inovação tecnológica adequados, difusão e crítica da
produção técnico-científica, massificação da informação sobre as políticas
públicas e as ações devotadas ao fomento da agricultura familiar no Bioma
Caatinga e por meio do debate sobre processos produtivos, de gestão e
organização social apropriados às suas peculiaridades culturais, sociais,
políticas, econômicas e ambientais. Três princípios básicos fundamentam essa
construção.
Em primeiro lugar, o
fomento de um modelo de desenvolvimento baseado nos preceitos da sustentabilidade,
isto é, uma estratégia para a promoção da melhoria de vida das populações
atuais pautada pela reflexão sobre as gerações futuras, em que estão
concatenados desenvolvimento econômico, desenvolvimento humano e responsabilidade
ambiental.
Articulado a isso, a
sociedade precisa entender que os camponeses são portadores de uma identidade
cultural e de uma ética próprias associadas a um modo de vida não capitalista que,
embora pressionadas por um sistema econômico cuja hegemonia pontua para a
maximização do lucro, a ampliação do consumo e a mercantilização da terra e do
trabalho, reitera suas particularidades e se reinventa cotidianamente,
interagindo positivamente com a modernidade. Assim, é necessário oferecer a
esses sujeitos sociais elementos para o resgate de sua identidade cultural e expertise técnica tradicional como uma
estratégia para desenvolver a auto-estima e autodeterminação necessárias para
que eles, preservando seu ethos,
possam manter relações mais positivas com o sistema econômico hegemônico.
Finalmente, é
imprescindível que se invista na implementação de um modelo produtivo adequado
ao modo de vida desses camponeses, ao território que eles habitam e às
necessidades impostas pelo sistema econômico. É um modelo “pluriativo” que
privilegia o trabalho e sua remuneração e que se adapta aos fatores naturais,
biológicos e meteorológicos. Isto é, um modelo que respeita os produtores, os
consumidores e a natureza num projeto social renovado. É um modelo que propõe
uma agricultura com baixo consumo de insumos comerciais e alto investimento em
trabalho e em tecnologias apropriadas, capaz de manter um nível de emprego
rural elevado e assim evitar o crescimento dos desequilíbrios territoriais e
sociais ligados à forte urbanização. Dessa forma, ela pode ser competitiva
economicamente e mais justa socialmente, pois concorre, por um lado, para a segurança
alimentar das populações rurais através do autoconsumo, e também das populações
das cidades através da venda de excedentes.
Foi este o principal
objetivo da criação da Universidade Camponesa em 2003 no Cariri Paraibano e
hoje constitui a base e a motivação do projeto acadêmico do Centro de
Desenvolvimento Sustentável do Semiárido, campus
de Sumé da UFCG.
terça-feira, 20 de setembro de 2011
Dirigentes da UFCG são homenageados com Título de Cidadania em Sumé
"Uma conquista coletiva, promovida por homens, idéias e ações, num tempo certo”. Assim sintetizou o reitor Thompson Mariz ao falar sobre as razões que o levaram a ser agraciado com o título de cidadão sumeense, na noite da última sexta-feira, 16.
Referindo-se às inúmeras manifestações promovidas pela população da região “ecoadas no Grito do Cariri”, mobilização símbolo da conquista de um campus da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) na cidade de Sumé, Mariz dividiu a honraria com seus, agora, concidadãos.
O diretor do Centro de Desenvolvimento Sustentável do Semiário (CDSA), campus da UFCG em Sumé, Márcio Caniello, discorreu sobre o destino, traçado pelas circunstâncias e emoções, que também o levou a receber o título de cidadão sumeense.
“Das decisões, circunstâncias, racionalidade ou emoções o destino se faz, na ação do homem. Esse momento, essa acolhida como cidadão dessa terra, é consequência muito mais da emoção que faz brotar coisas boas”, ressaltou, afirmando que a paixão pela cidade foi à primeira vista - quando trabalhava numa pesquisa científica.
E ilustrando seu discurso com trecho de uma crônica do jornalista Irineu Joffily (Gazeta do Sertão, 1888), Caniello também fez uma rápida leitura do homem e seu tempo, das pontes que a educação ergue para o desenvolvimento social e humano.
Além do reitor e do diretor do CDSA, também foram agraciados com a cidadania sumeense o superintendente estadual da Funasa, Bruno Gaudêncio, o pároco de Sumé, padre Haroldo Andrade, o ex-prefeito de Gurjão, José Carlos Vidal, e o engenheiro Eronaldo Pereira dos Santos.
quarta-feira, 14 de setembro de 2011
quinta-feira, 23 de junho de 2011
“Viva São João!", ou o espírito rural do Brasil
Nos últimos anos, desenvolve-se um importante debate no meio acadêmico brasileiro sobre a “ruralidade” do Brasil atual, uma vez que as estatísticas oficiais têm demonstrado, censo a censo, que houve um forte processo de urbanização do país na segunda metade do Século XX, pois a população rural brasileira despencou de 55%, em 1960, para apenas 15% em 2010, de acordo com o IBGE.
Embora os números sejam eloquentes e reflitam um processo demográfico real, uma importante corrente de cientistas sociais brasileiros os consideram superdimensionados, em função da matriz conceitual e política que os envolve. Em artigo que sumariza os argumentos dessa corrente crítica, a professora Maria de Nazareth Wanderley ressalta, fundamentalmente, que a definição do recorte rural/urbano é uma atribuição dos municípios, que têm interesse em superdimensionar a área urbana, uma vez que o Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/1966) estabelece que os impostos municipais são arrecadados na zona urbana e os federais nas áreas rurais. Assim, “a extensão exagerada das zonas urbanas é um artifício para o incremento das receitas locais” (Wanderley, 2009).
Acrescenta Wanderley que dois dispositivos jurídicos favorecem essa manobra, ambos especificados no artigo 32 do CTN. O parágrafo 1º “associa a condição urbana à existência de melhoramentos, mas admite que para ser considerada urbana, basta a uma zona dispor de pelo menos 2 (dois) dos incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público: I - meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais; II – abastecimento de água; III – sistemas de esgotos sanitários; IV – rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar; V – escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado”. Por outro lado, o parágrafo 2º flexibiliza ainda mais a definição ao prever que “a lei municipal pode considerar urbanas as áreas urbanizáveis, ou de expansão urbana, constantes de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes, destinados à habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que localizados fora das zonas definidas nos termos do parágrafo anterior” (Wanderley, 2009).
Esses critérios definidos há 45 anos no CTN estão, evidentemente, desatualizados, não refletem a realidade atual do campo no Brasil e, portanto, as legislações municipais que fundamentam a matriz estatística do IBGE alimentam, nas palavras de José Eli da Veiga, a “ficção oficial” de que o Brasil é mais urbano do que realmente é (Veiga, 2002). De fato, segundo o Censo de 2010, 70% dos municípios brasileiros têm até 20.000 habitantes: em que medida podemos realmente considerá-los “urbanos”?
Neste post quero expressar um argumento em favor das teses esposadas por Veiga e Wanderley sobre a ruralidade do Brasil. E aqui não falarei como o economista ou a socióloga, mas como antropólogo que sou, procurarei demonstrar que as festas juninas, um verdadeiro patrimônio histórico da cultura brasileira, explicitam o quão rural é nosso “espírito nacional” e, portanto, a sociedade brasileira. Sigo aqui uma premissa básica da ciência que procuro professar e que me foi incutida pelo meu Mestre, Roberto DaMatta: é através de suas festas que um povo expressa sua real identidade, isto é, sua essência existencial, recôndita no fundo da alma por mecanismos racionais que muitas vezes a ocultam por razões diversas, inclusive a vergonha.
As festas nacionais, como o carnaval magistralmente interpretado por DaMatta no livro Carnavais, malandros e heróis (1978), são “dramas metafóricos” cíclicos, realizados fora do cotidiano das pessoas, num período demarcado, em que elas podem “se soltar”, vivenciando por algumas horas ou dias facetas de sua personalidade social – ou do que denomino, apoiando-me em Hegel, de “espírito nacional” (Caniello, 2001) - que não explicitam no dia-a-dia, porque ali desempenham outros papéis, relacionados com o mundo do trabalho e com os imperativos do status social e econômico que dominam e circunscrevem o indivíduo na sociedade ocidental.
Assim ocorre com nossa identidade rural, que começou a ser “deteriorada” simbolicamente na medida em que os valores do industrialismo e da urbanização passaram a dominar ideologia de progresso que o Brasil passou a adotar a partir da Revolução de 30. A triste imagem do Jeca Tatu, estereótipo do “caipira”, “matuto” ou “tabaréu” oferecido à cultura brasileira por Monteiro Lobato em 1918 com a publicação de Urupês, constitui-se num arquétipo negativo da ruralidade, hoje impresso fundamente na alma nacional. Assim, renegamos nossa ruralidade como se ela fosse um símbolo do atraso que conseguimos superar com o “progresso” resultante da industrialização e da urbanização, não importa a que custo, nesse processo batizado, com rara felicidade, por Alberto Passos Guimarães, como “modernização conservadora”.
Mas, nas festas juninas, rurais por sua natureza intrínseca, esquecemos isso tudo e nos transmutamos. Não há criança ou adulto no Brasil - a exceção, evidentemente, dos próprios habitantes da zona rural - que não tenha pelo menos uma vez na vida se fantasiado de “caipira”, como se diz no centro-sul do país, ou de “matuto”, como se diz no Norte e no Nordeste, para participar de um evento alegre, luminoso e extremamente gregário, que nossa memória não esquece jamais.
Os dias de Santo Antônio (13/06), São João (24/06) e São Pedro (29/06) são festejados efusivamente nos quatro cantos do país, da mesma maneira nas cidades e no campo, com o cardápio típico, a fogueira, as bandeirinhas, os balões, os fogos, o mastro, a quermesse, a quadrilha e o boi... É bem verdade que as festas juninas apresentam ricas variações regionais que expressam a dimensão continental do país e a formação sincrética do povo brasileiro, mas sua “regularidade sociológica estrutural”, como diria Lévi-Strauss, as fixam como um verdadeiro ritual nacional. Aliás, arrisco-me a dizer, cutucando filialmente o Mestre DaMatta, que nós, brasileiros, somos mais juninos do que carnavalescos - portanto mais rurais do que urbanos - pois enquanto o carnaval é um evento realizado apenas nas cidades, as festas juninas, rurais em sua natureza, são realizadas, indiscriminadamente, nas cidades e no campo, em todas as regiões do país.
As festas juninas são a principal festividade dos habitantes da zona rural do Brasil e um “drama metafórico da ruralidade” para os brasileiros das cidades. Nós as realizamos todos os anos para lembrarmos, ardentemente, quão rural é o nosso espírito nacional.
Viva São João!!! Viva o Povo Brasileiro!!! Viva o Brasil Rural!!!
sexta-feira, 17 de junho de 2011
Ministério do Desenvolvimento Agrário convida UFCG para elaborar projeto
Por Marinilson Braga - Ascom/UFCG
Secretário Jerônimo Rodrigues pede plano de capacitação para o Programa Territórios da Cidadania
Secretário Jerônimo Rodrigues pede plano de capacitação para o Programa Territórios da Cidadania
“Vivemos um momento de extrema exigência de inteligência, com um conjunto de ações que precisamos aperfeiçoar”, declarou o secretário de Desenvolvimento Territorial do Ministério do Desenvolvimento Agrário (SDT/MDA), Jerônimo Rodrigues, em reunião com o Colegiado Territorial da Borborema na noite dessa quinta-feira, 17, no campus da UFCG em Campina Grande.
Para ele, a Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), com o seu Know-how, tem muito a oferecer no pensar e no fazer do Programa Territórios da Cidadania, apresentando ideias e promovendo ações que repercutam propositivamente como um novo salto na estratégia de desenvolvimento territorial sustentável.
O secretário, ao traduzir o estágio atual do programa, revelou a necessidade de ampliar horizontes para a captação de recursos e, consequentemente, tornar mais eficiente sua aplicação no combate à pobreza e desigualdades sócias no meio rural.
“Precisamos dar impulso a um mutirão de intelectualidade. Começando aqui, com a UFCG formatando um projeto”, desafiou Rodrigues, convocando o coordenador da Célula de Acompanhamento e Informação do Território da Borborema, professor Márcio Caniello, a pensar e arquitetar tal proposta.
O desafio
Para evitar a perda de recursos e a redução de programas, necessário que se qualifique a gestão e haja uma logística financeira, defende o secretário, assim, nos próximos quatro anos – já na elaboração do Plano Plurianual (PPA 2011-20115) consiga-se ampliar o volume de recursos destinados ao MDA.
A expectativa é de que no núcleo da Borborema, pelo pionerismo do projeto Universidade Camponesa da UFCG, as respostas e provocações brotem e projetem um novo momento: o da capacitação. “Começando na Paraíba, em Campina Grande, um plano de habilitação que aprimore as coordenações e auxilie os colegiados, principalmente do Norte e Nordeste, na elaboração e gestão de projetos”, ressaltou.
A resposta
A UFCG está a serviço do país, na busca constante de respostas para as problemáticas sociais, seja interagindo, gerando ou gerindo processos, respondeu Caniello. “Entre tantas contribuições, a universidade tem atuado. Criando bases e fortalecendo plataformas, temos promovido o capital social”.
“Cursos de extensão voltados à gestão pública e a criação de uma rede de ensino a distância são ferramentas que a universidade pode explorar para a capacitação e qualificação dos atores sociais”, expôs.
O pesquisador também fez uma breve reflexão sobre um de seus trabalhos acadêmicos que - segundo o secretário - será instrumento de debate em reunião de equipe na Secretária como pauta de reflexão, nos pontos da “eficiência, da eficácia e da efetividade”.
Mobilização
O encontro também debateu pontos estratégicos para a operacionalização de movimentos com atores sociais, rurais, como artesãos, mulheres e jovens que, balizados por um projeto de comunicação, consigam despertar a população rural de baixa renda para uma maior integração ao programa e sensibilize o país, em especial a classe política, para a ampliação de projetos direcionados ao desenvolvimento sustentável.
Publicado no Portal da UFCG
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