Lula tem repetido reiteradamente que se não for para realizar um governo melhor do que os seus dois anteriores, ele não teria disputado a eleição. Não há porque duvidar das intenções do presidente da República, um político franco, sério e coerente, que demonstrou a solidez do seu caráter em muitas ocasiões, especialmente na longa e dura perseguição jurídico-midiática que resultou em sua prisão injusta de 580 dias.
Mas, conseguirá Lula realizar o seu intento? Essa é uma missão muito difícil, pois os seus dois primeiros governos foram extremamente bem-sucedidos, o que, aliás, se refletiu na aprovação recorde de 87% que obteve ao final do seu segundo mandato. Por outro lado, Lula encontra o país numa situação econômica pior do que a que herdou de FHC em 2003, um Banco Central "independente" aparelhado pelo rentismo, um povo dividido, com amplos setores instilados pela mentira e pelo ódio, e o pior Congresso Nacional da história republicana, conservador, reacionário e fisiológico como nunca.
Felizmente, as primeiras ações concretas do Governo Lula III demonstram que o presidente da República está no caminho certo. O primeiro sinal disso foi a aprovação da PEC da Transição, ainda antes da posse, medida fundamental para o encaminhamento das propostas do Programa de Governo.
Depois, veio a cerimônia de posse, a maior e mais emocionante já realizada no Brasil. Um show de mobilização, organização e sensibilidade (eu fui com a família e choramos várias vezes, como muita gente lá e no Brasil inteiro). Foi um evento carregado de positividade e simbolismo, que culminou com a entrega da faixa, que passou pelas mãos de cada um dos oito representantes da sociedade civil que subiram a rampa com Lula e Janja - uma criança, um indígena, um deficiente físico, homens e mulheres, negros e brancos - até ser colocada no peito do presidente por uma catadora de recicláveis. A participação da cadelinha Resistência deu uma nota de modernidade e intimidade à cerimônia, que, na minha opinião, foi impecável.
Uma semana depois, entretanto, veio a intentona golpista. O infame 8 de janeiro, enfrentado com precisão cirúrgica pela equipe do governo, com o ministro Flávio Dino no comando. Tudo foi feito com muita presteza, profissionalismo e bom senso: a intervenção na Secretaria de Segurança do Distrito Federal; a presença de Lula, já na noite de domingo, num Palácio do Planalto destruído; a detenção de mais de mil golpistas sob a coordenação do interventor Ricardo Capelli, braço direito de Dino, no dia seguinte; a reunião dos chefes dos Três Poderes no palácio presidencial e o cortejo cruzando a praça mais famosa de Brasília rumo ao Supremo Tribunal Federal, na noite de segunda-feira; a estratégia de comunicação que fez com que a opinião pública viesse a condenar veementemente o quebra-quebra golpista. Foi um verdadeiro teste de fogo, superado com méritos pelo Governo em articulação com o ministro Alexandre de Morais, o maior responsável pela higidez do processo eleitoral de 2022 e um dos grandes nomes no enfrentamento à intentona golpista, diga-se de passagem.
Seguiu-se, então, a montagem do governo - em relação à qual tenho as minhas críticas, que serão expostas no próximo post - e o encaminhamento de ações e medidas concretas. Destaque para a recomposição dos orçamentos da educação (+25 bilhões de reais em relação a 2022), saúde (+23 bi) e infraestrutura (+11 bi), recursos que já estão sendo empregados, por exemplo, na retomada de mais de 2.400 obras paradas de creches e escolas do ensino infantil e básico, no aumento de 39% para a merenda escolar, no reajuste de até 200% nas bolsas de estudos de graduação, mestrado e doutorado, no envio de 600 milhões para estados e municípios reduzirem a fila de cirurgias e em quase 2 bilhões liberados para a para manutenção de rodovias.
Entrementes, o governo anunciou a volta do Programa Minha Casa Minha Vida, com 9,5 bilhões de orçamento, tendo como meta entregar 2 milhões de moradias até 2026; implantou o novo Bolsa Família, que começou a ser pago hoje, no valor mínimo de 600 reais, mais 150 reais para crianças até 6 anos e 50 reais por cada membro da família entre 7 e 18 anos e mulheres gestantes; e lançou, também hoje, o novo Mais Médicos, com a abertura de 15 mil novas vagas e a projeção de 28 mil profissionais fixados em todo o país até o final do ano.
Em relação às ações emergenciais, o Governo Lula III também foi extremamente eficaz, como no socorro aos índios Yanomami - com o desmantelamento do garimpo ilegal, mais de 5 mil atendimentos realizados por 100 profissionais de saúde, 5,5 mil cestas básicas distribuídas e a instalação de hospital da Aeronáutica - e no apoio às cidades vítimas da tragédia do litoral Norte de São Paulo, com envio de 120 milhões de reais e até do super navio da Marinha equipado com hospital de campanha e quase 300 leitos.
É digno de nota, especialmente para os povos que convivem com a seca, a alocação de R$ 500 milhões para a construção de 100 mil cisternas no Semiárido brasileiro, programa abandonado pelo governo anterior, e a liberação de R$ 430 milhões para mitigar os efeitos da estiagem no Rio Grande do Sul, com auxílio de R$ 4,8 mil para cada família carente afetada.
Finalmente, não podemos deixar de registrar o aumento de 9% no salário mínimo, 3% acima da inflação, restabelecendo a política de valorização abandonada desde o golpe de 2016, e o reajuste de 39% na tabela do Imposto de Renda, o primeiro desde 2015, o qual isentará quase 14 milhões de brasileiros e brasileiras e beneficiará, sobretudo, a classe média, principal formadora da opinião pública.
Essas são algumas das ações concretas implementadas em exatos 80 dias do Governo Lula III. Elas parecem indicar que o presidente da República trabalha, de fato, para fazer um grande governo. Se será o melhor, só o tempo dirá.