quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Carta Aberta à Comunidade Acadêmica do CDSA

Aos professores, servidores técnico-administrativos, estudantes, colaboradores terceirizados e parceiros do Centro de Desenvolvimento Sustentável do Semiárido.

Prezados amigos e prezadas amigas,

Ao cumprimentá-los cordialmente neste reinício de atividades letivas, venho dirigir-me a Vossas Senhorias para informar-lhes o seguinte:

1.  No dia 29 de dezembro de 2012, quando me encontrava em Brasília de férias com minha família para os festejos de final de ano, tive a honrosa surpresa de receber um telefonema do prefeito eleito de Campina Grande, Romero Rodrigues, em que este, finalizando a composição da sua equipe de governo que seria anunciada no dia 31/12 pela manhã, me formulou um convite para que eu assumisse o cargo de secretário de Planejamento do município. Segundo o prefeito, o motivo para tal escolha foi a minha trajetória como professor e gestor na UFCG, especialmente na elaboração e execução do Plano de Expansão Institucional da Universidade (PLANEXP), que propiciou a criação de três novos campi da Instituição nos municípios de Cuité, Pombal e Sumé;
2.  Diante da exiguidade de tempo para dar minha resposta ao prefeito eleito, apenas 24 horas, e estando eu fora da Paraíba, fiz várias consultas por telefone à família, amigos, professores, servidores técnico-administrativos e estudantes do CDSA e de outros setores da UFCG que compõem o agrupamento político do qual faço parte, além de meu superior hierárquico, o Magnífico Reitor Thompson Fernandes Mariz, e resolvi aceitar o convite do prefeito eleito;
3.   Pesou em minha decisão, sobretudo, a oportunidade de retribuir ao acolhimento que me deu Campina Grande – cidade em que vivo há 27 anos, onde constituí família, fiz inúmeros amigos e construí minha trajetória profissional como professor da UFCG – dando minha contribuição na pasta do Planejamento, historicamente comandada por professores da Instituição, como Telmo Araújo, Jurandir Xavier, Paulo de Tarso, Érico Miranda e Ricardo Pedrosa, este último servidor técnico-administrativo. Estimulou-me vivamente a perspectiva de colaborar para o planejamento de curto, médio e longo prazo de uma cidade do porte e da importância de Campina Grande, atuando de maneira direta no enfrentamento dos desafios pela melhoria da qualidade de vida da população, especialmente a mais desfavorecida, numa conjuntura em que a cidade vê seu PIB municipal crescer a uma taxa média anual de 10% desde 2005;
4.  Antes de tudo, porém, levei em consideração que, somados o mandato pro tempore e metade do mandato eletivo, no final de 2012 eu completei quatro anos no comando do CDSA, período em que enfrentamos inúmeras e sérias dificuldades para a implantação do campus, a maior delas o abandono de sete obras, as quais, contudo, não significaram qualquer solução de continuidade das atividades acadêmicas e administrativas. Pelo contrário, atualmente o CDSA é um centro de ensino, pesquisa e extensão consolidado, contando com o suporte de docentes e servidores técnico-administrativos que, embora recentemente ingressados no serviço público, em sua ampla maioria já passaram pelo estágio probatório, estando hoje plenamente capacitados para a condução das atividades meio e fim;
5.    Por outro lado, considerando as obras concluídas e em andamento, cerca de 80% da infraestrutura projetada do campus está implantada ou em implantação, com todas as obras outrora paralisadas concluídas ou em fase de conclusão, além de novas obras em andamento e novos ambientes inaugurados e equipados, como biblioteca, duas centrais de aulas, três centrais de laboratórios, ambiente de professores, duas residências universitárias, almoxarifado, garagem, pórtico de entrada, laboratórios provisórios, Núcleo de Extensão Cultural (NEXT), Núcleo de Produção Agropecuária (NUPAGRO), Mini Fazenda Experimental, drenagem, pavimentação e urbanização do campus, dentre outras. Do projeto apresentado ao MEC resta apenas serem licitadas as obras do restaurante universitário, praça de convivência (com projetos em fase avançada de elaboração pela PU), direção do Centro e bloco das Unidades Acadêmicas, que atualmente funcionam em ambientes reformados que atendem plenamente às necessidades;
6.  Também levei em conta que todos os projetos pedagógicos dos cursos já se encontram aprovados na Instituição e que as duas unidades acadêmicas já estão plenamente consolidadas e vêm desenvolvendo suas atividades meio e fim com excelência, sob todos os pontos de vista. É bem verdade que a carência de servidores técnico-administrativos ainda tem que ser equacionada, mas a nomeação das duas secretárias executivas recentemente aprovadas em concurso dará um reforço às unidades acadêmicas, já que é intuito da direção lotá-las na UAEDUC e UATEC;
7.   Ademais, em vista da experiência do professor José Vanderlan Leite de Oliveira como diretor de centro na UFRR e das competências que ele desenvolveu após dois anos como vice-diretor do CDSA compartilhando conosco a execução das tarefas para a implantação do novo campus, ele terá, contando com o apoio da competente Secretária do CDSA, Rúbia Quaresma de Freitas, plenas condições de comandar as jovens, porém agora experientes equipes administrativas formadas pela Direção – Gerência Administrativo-Financeira (GEAF), Prefeitura do Campus (PUC), Gerência de Assuntos Estudantis (GAE), Assessoria de Ensino, Assessoria de Pesquisa, Assessoria de Extensão, Assessoria de Monitoria e Estágios, Assessoria de Esportes e Lazer, Coordenação de Informática e Comissão Interna de Avaliação (CIA) – no sentido de manter a qualidade do funcionamento do CDSA e concluir a implantação do campus até 2014, cumprindo nosso compromisso de campanha pela direção, compromisso este referendado e assumido publicamente pelo reitor e vice-reitor eleitos, professores José Edílson Amorim e Vicemário Simões;
8.      Portanto, no meu sentir, minha renúncia ao cargo de diretor do CDSA não significará qualquer prejuízo ao bom andamento das atividades do centro e, tampouco, às obras de implantação do campus, o que me tranquiliza a enfrentar este novo desafio que se me apresenta, o qual abraço com grande entusiasmo, mas com um pequeno travo na alma, trazido pela saudade que já sinto dos amigos e amigas que logrei fazer no CDSA e no Cariri. Contudo, depois de me dedicar por sete anos à expansão da UFCG, dividindo minha morada entre Campina Grande e Cuité (2006-2008) e Campina Grande e Sumé (2009-2012), penso que é chegado o momento de voltar ao lar;
9.    Assim, no dia 8 do corrente, após o Magnífico Reitor autorizar, de ofício, minha disponibilidade funcional à Prefeitura Municipal de Campina Grande sem ônus para a UFCG, renunciei ao cargo de diretor do CDSA e me afastei das atividades na Instituição, fato que não impedirá que eu conclua a disciplina Sociedades Camponesas (semestre 2012.2), compromisso que firmo desde já com os estudantes do sexto período de Ciências Sociais e com os colegas da UAEDUC.

Agradeço penhoradamente a todas as pessoas que compartilharam comigo os desafios, as tarefas e os bons e maus momentos na implantação do campus de Sumé – professores, servidores técnico-administrativos, estudantes, colaboradores terceirizados e parceiros – tendo a convicção de que, nos limites de minha capacidade, tudo fiz para o sucesso desta grande empreitada que caminha a passos largos para o pleno sucesso.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Educação, Direitos Humanos e Cidadania no Semiárido - Prefácio


A Universidade Federal de Campina Grande tem uma forte tradição extensionista, com fundamentos fincados na sua origem mais remota, a Escola Politécnica de Campina Grande (POLI), criada em 1952 a partir da mobilização da sociedade civil organizada, numa conjuntura em que a cidade se destacava como o principal polo de desenvolvimento do interior do Nordeste e um dos mais dinâmicos do Brasil.
No auge do “Ciclo do algodão”, Campina Grande era chamada de Liverpool brasileira, por ser a segunda maior exportadora mundial da fibra. No quadriênio 1950/1954, o município contribuía com 1/3 da receita fiscal do Estado e, em 1955, sua arrecadação de impostos foi maior do que a de seis capitais nordestinas (Aracaju, Maceió, João Pessoa, Natal, Teresina e São Luís), superando ainda Florianópolis, Manaus e Cuiabá. Em 1959 havia 111 estabelecimentos industriais na cidade, contra 93 em João Pessoa. Aliás, a pujança industrial de Campina Grande era tão expressiva, que a única sede de Federação das Indústrias fora de uma capital de Estado no Brasil foi ali implantada, em 1949, permanecendo até hoje na cidade.
Assim, de acordo com documentos da época, a criação da Escola Politécnica de Campina Grande visava cumprir um duplo objetivo: oferecer educação superior aos jovens campinenses e ser um instrumento de desenvolvimento para a região, isto é, assumindo um perfil institucional claramente extensionista. A escolha do curso de Engenharia Civil para inaugurar o ensino superior na cidade representa a cabal demonstração deste fato. Em face do número expressivo de obras públicas então em andamento na órbita da cidade (açude Epitácio Pessoa, em Boqueirão, a abertura da Rodovia Central da Paraíba, atual BR-230, a construção do ramal ferroviário Campina Grande-Patos, dentre outras) e o aquecido mercado imobiliário da cidade, movimentado pelo dinheiro do algodão, oferecia um amplo campo de trabalho para os egressos, que, além da inserção profissional regular como profissionais liberais, poderiam atuar diretamente no processo de desenvolvimento local, como verdadeiros protagonistas da implantação da infraestrutura que visava sustentar o progresso regional.  Com efeito, a própria construção do modernista edifício sede da POLI foi projetada e executada por um “Escritório Técnico” formado por professores e estudantes do curso de Engenharia Civil, criado em 1954.
A partir da fundação da Faculdade de Ciências Econômicas de Campina Grande (FACE), em 1955 e da criação, no final do mesmo ano, da Universidade da Paraíba, congregando várias escolas superiores isoladas em João Pessoa, Campina Grande e Areia, o compromisso do ensino superior campinense com o desenvolvimento local ganha novas cores, enriquecido pela reflexão humanística. De fato, em 1956 é criado o “Grupo Desenvolvimentista Campinense”, com presença de professores e alunos da POLI e da FACE, após a realização do Iº Encontro de Bispos do Nordeste em Campina Grande, com a presença do Presidente Juscelino Kubitscheck, que teve como decorrência a criação do Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), origem da SUDENE. O Grupo Desenvolvimentista Campinense atuou intensamente na reflexão sobre o desenvolvimento local e, em 1958, no “pico” de uma grande seca, é oferecido o primeiro Curso de Extensão de que se tem notícia na Instituição, denominado “Problemas do Nordeste”, o qual se tornaria uma disciplina regular do currículo de Engenharia da POLI.
Depois da federalização da Universidade da Paraíba em 1960, um dos últimos atos do governo JK, o primeiro novo curso criado em Campina Grande foi o de Sociologia e Política da FACE, em 1962, que daria um tom de engajamento social e espírito crítico ao campus campinense, numa época efervescente da vida nacional.
Mas, o regime de exceção implantado em 1964 viria a inibir fortemente o viés desenvolvimentista da escola superior, particularmente no campo humanístico, tolhendo suas interações mais orgânicas com a sociedade e suas organizações. Entretanto, ainda durante o período ditatorial, um reitor visionário viria a reconfigurar o perfil da Instituição, revitalizando sua vocação interacionista e seu compromisso com o desenvolvimento local.
Entre 1976 e 1980, Lynaldo Cavalcanti transformou a Universidade Federal da Paraíba, colocando-a entre as maiores do Brasil, com sua inédita estrutura multicampi. Expandiu e interiorizou, fundando os campi de Bananeiras, Patos, Sousa e Cajazeiras. Com a instalação de mais de 20 núcleos interdisciplinares, a universidade reconstruía os caminhos da excelência na pesquisa e extensão e, em plena ditadura militar, a universidade se politizava com a nomeação de professores de alto nível, muitos deles de esquerda, alguns voltando do exílio e outros saindo do ostracismo forçado pelo regime de exceção.
Já nos estertores do interregno ditatorial, contando com esse novo caldo cultural, a extensão universitária se restauraria vivamente no Campus II da UFPB, notadamente nas áreas tecnológicas, com o desenvolvimento e difusão de tecnologias apropriadas para o Semiárido, e na área humanística, com uma forte interação com os movimentos sociais e organizações da sociedade civil. Essas duas vertentes da extensão universitária confluíam para as camadas mais desfavorecidas da população residente na região mais pobre do país, renovando os compromissos proativos da Instituição com o desenvolvimento local e a inclusão social.
Com a criação da UFCG em 2002 por desmembramento da UFPB, congregando os campi de Campina Grande, Patos, Sousa e Cajazeiras, um novo ciclo institucional se inicia e o reitorado pro tempore de Thompson Mariz mostrar-se-ia amplamente favorável às ações de extensão. Digo isso “a cavaleiro” porque tive a felicidade e a honra de contar com o seu entusiasmo, apoio e parceria na construção do Projeto Universidade Camponesa (UNICAMPO), uma ambiciosa ação de extensão universitária compartilhada com o CIRAD, instituição francesa com a qual mantínhamos um convênio de cooperação. O campus avançado implantado em solenidade presidida pelo jovem reitor na Escola Agrotécnica de Sumé em setembro de 2003 para o desenvolvimento das atividades do projeto seria a “cabeça de ponte” do Plano de Expansão Institucional (PLANEXP) da UFCG, através do qual criaríamos três novos campi entre 2006 e 2009: Cuité, Pombal e Sumé. Profecia autorrealizável que cometemos numa reunião com Thompson Mariz em 2003 quando apresentamos pela primeira vez o projeto de extensão, seu apelo foi tão fundo, que sensibilizou o reitor a ponto de motivá-lo a pedir audiência com o então ministro da Educação, Cristóvão Buarque, para que eu, ao lado dele e do legendário Lynaldo Cavalcanti, apresentasse a ideia ao próprio ministro. No dia 03/09/2003, o Correio da Paraíba noticiou a memorável audiência, estampando uma manchete ainda mais profética que a minha: “Universidade deverá ser criada na cidade de Sumé”.
E assim foi. Do projeto de extensão UNICAMPO, surgiram os três novos campi da Instituição, entre os quais o de Sumé, onde estão lotados os professores e matriculados os estudantes que nos brindam com os trabalhos publicados neste instigante Educação, Direitos Humanos e Cidadania no Semiárido, fruto de projetos aprovados no Programa de Extensão Universitária (PROEXT) em 2011, quando o Centro de Desenvolvimento Sustentável do Semiárido (CDSA) contava com pouco mais de um ano de funcionamento.
São reflexões sobre projetos de extensão que estão agindo concretamente sobre questões cruciais da vida social da região, como o pleno acesso à educação pelos deficientes auditivos, que inclusive redundou num convênio entre o CDSA/UFCG e a Prefeitura Municipal de Sumé para a criação de uma escola bilíngue que atualmente atende a estudantes surdos de todo o Cariri paraibano, a inclusão educacional de sujeitos com deficiências mentais e as problemáticas da violência, do poder, da cidadania e dos direitos humanos, enfeixadas no âmbito do Centro de Direitos Humanos do Cariri Paraibano, instalado no CDSA em parceria com a Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República.
Os trabalhos aqui publicados demonstram que a vocação extensionista da UFCG está cada vez mais viva, renovando-se a cada dia seu compromisso proativo com os segmentos sociais mais vulneráveis e excluídos, compromisso este agora revigorado com os novos atores de “dentro” e de “fora” da Instituição, incluídos no processo de ensino, pesquisa e extensão pela democratização do acesso a ela, propiciado pela recente expansão institucional, que, trilhando os caminhos da interiorização, encontra e procura transformar este lindo, mas sofrido Brasil mais profundo.

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Por que a Carreira Docente Unificada da ANDES é prejudicial às Universidades e à Ciência Brasileira?


Por Rose Clívia Santos
Professora Adjunto I Setor de Física e Matemática
Departamento de Ciências Exatas e da Terra Universidade Federal de São Paulo
UNIFESP – Campus Diadema
Estou convencida que a carreira docente proposta pela ANDES é um desestímulo para a pesquisa brasileira. Entendo que os professores do ensino básico, médio e das escolas técnicas possam desejá-la intensamente, mas defenderei em qualquer fórum desse País que esta carreira não é interessante para as Universidades Federais.  Portanto, não posso concordar com a continuidade do movimento e os motivos que me fazem chegar a esta conclusão serão expostos a seguir.
O trecho inicial da proposta de projeto de Lei da ANDES  diz no seu artigo primeiro:
Art. 1º Fica consolidado o Plano de Carreira e Cargo de Professor Federal que reestrutura as carreiras e os cargos do magistério da União, incluídas suas autarquias e fundações, nos termos desta Lei. 
Todo magistério federal envolvendo o ensino básico, médio, técnico, tecnológico e a Universidade Federal se enquadraria nesse plano de carreira e cargos. Em uma primeira análise, pode parecer justo. Dois professores com a mesma titulação, um lecionando no ensino básico federal e o outro “ensinando” na Universidade, teriam o mesmo salário caso tivessem o mesmo tempo de serviço público, pois estariam exatamente no mesmo nível.  Afinal ambos são Professores Federais.
A proposta da ANDES é vendida como o melhor dos mundos.  A simplicidade é tão grande que é impossível não acender imediatamente o pisca-alerta em nosso cérebro. Esta solução final, na verdade é um tiro no pé das Universidades Federais e nos afetará cruelmente a médio e no longo prazo.
Sabemos que a carreira acadêmica é permeada por uma competição internacional. É necessário publicar, participar ou organizar congressos nacionais e internacionais, orientar teses, participar da extensão, ter envolvimento institucional além de ministrar as aulas.  Não reconhecer ou anular essa assimetria ou extrema desigualdade com o Ensino Básico é a deficiência mortal da carreira unificada.
Muitas vocações e talentos científicos se perderiam pela simples possibilidade de seguir uma carreira economicamente mais interessante, menos estressante e mais rápida. Vamos então a questão básica: Onde seria mais fácil progredir na carreira,  na Universidade ou no Ensino Básico?
Considere a seguinte situação hipotética (mas provável). Siga os passos indicados na Figura 1.
Dois jovens talentosos concluem a graduação (mesmas condições iniciais). O primeiro decide fazer mestrado e doutorado (e pelo menos um pós-doc), pois deseja ser professor Universitário. O outro, mais pragmático e já preocupado com a carreira, opta por ficar como professor no ensino básico ou médio. Como os 2 jovens evoluirão suas carreiras?










O graduado iniciará no nível 1,  recebendo mais do que uma simples bolsa e obviamente com as vantagens trabalhistas.  Já o nosso candidato a cientista levará em média mais 7 anos para terminar (mestrado, doutorado e um 1 ano de pós-doc) e  como é capacitado, vai entrar  imediatamente na Universidade (Nível 1, com doutorado em 2021).  Para simplificar, supomos que ele fez 2 anos de pós-doc (o resultado final não será muito diferente se considerarmos 1 ano).
Repetindo, após 8 anos o nosso Doutor com Pós-doc terá entrado na Universidade – Nível 1 (com doutorado) enquanto o  nosso graduado (igualmente talentoso)  já terá  subido 4 posições e estará no nível 5.   Embora em ritmo mais lento, poderá até ter feito  o Mestrado pois  afinal foram 8 anos.  Assim, pedirá afastamento para fazer o doutorado  e já  durante o curso contará preciosos níveis a cada 2 anos. Portanto, ao final dos 4 anos terá seu título de doutor e estará agora no nível 7 (levou 12 anos para concluir o doutorado e atingir esse nível).  Nesse tempo, o nosso “cientista desavisado” (convivendo com todas as atribulações acadêmicas) atingirá  o nível  3. Isto se conseguir, pois sabemos que a carreira  na Universidade é  certamente mais exigente.
Ao fim e ao cabo, o nosso graduado pragmático (sem ter tido o estresse de viver 8 anos com bolsa) estará ganhando mais (pois será nível 7 com doutorado!) e fatalmente chegará ao nível 13 de sua carreira no ensino básico  8  anos antes e  com o mesmo salário que um dia obterá o nosso candidato a cientista (8 anos depois).
Na figura acima vemos a evolução dos dois professores. A linha preta marca a evolução do graduado que optou por entrar imediatamente no ensino federal (básico ou médio) e a verde (iniciando em 2021) representa a evolução do recém-doutor com Pós-doc.   Note também que a mudança de nível, de acordo com a última versão do projeto da ANDES a cada 2 anos.
Existem outras configurações onde o docente do magistério superior (MS) estará em desvantagem. Não tenham dúvidas que essa assimetria será imediatamente percebida pelos mais jovens e vai determinar escolhas futuras.
É por isso pessoal que essa carreira é perfeita para o ensino básico e um tiro no pé das Universidades.  Inevitavelmente, impactará negativamente na formação de nossos recursos humanos em Ciência e Tecnologia (C&T). Além disso, uma vez sendo aceita a Unificação, a ANDES terá a eterna gratidão do ensino básico, médio e técnico, passando simbioticamente a ser deles dependente. No futuro seremos minoritários (como já estamos na eminência de ser). Lembrem que de uma tacada só o governo Lula construiu mais de 200 escolas técnicas e mais unidades são necessárias  e deverão ser construídas Brasil afora.  Passaremos então a ouvir coisas do tipo: Olha, mas se temos a mesma atribuição e a mesma carreira, os docentes das Universidades também devem ter a mesma carga horária. Nada mais justo!  Esse será o golpe final na pesquisa realizada nas Universidades Federais.  Retrucaremos dizendo sim, mas nós temos outras atribuições e imediatamente escutaremos: nós também, cara pálida!  Convenhamos que não será impossível  provar isto.  Basta escolher cuidadosamente os argumentos e usar a força da maioria.
Por que isso não foi percebido antes? Porque a ANDES quer empurrar a carreira goela abaixo dos docentes Universitários, sem discussão, feito um rolo compressor. Pior, usando os números da greve para nos pressionar e manter calados, o que lhe permite cobrir o velório da pesquisa com o manto sagrado da justiça social.  De fato, tentei discutir várias vezes essa contradição da carreira em assembleias da UNIFESP.  Um dos argumentos contra que ouvi (e depois verifiquei que está no InforANDES de março de 2011) é que a carreira unificada foi aprovada por unanimidade no 30º congresso da ANDES. Ou seja, na falta de um argumento consistente, se usa a força de uma maioria completamente orientada com a proposta.
A defesa obcecada dessa carreira é inadmissível.  Parece que as consequências para a Universidade não foram analisadas com a devida profundidade.  Isto não ocorreu por culpa dos docentes e sim porque as discussões de fundo estão sendo evitadas ao longo dessa greve. Tudo é meio pirotécnico. No calor das assembleias o que importa é empurrar o movimento adiante.
Afirmei também em assembleias da UNIFESP que o governo jamais aceitará esta carreira unificada. Creio também que todo Governo sério, realmente preocupado com uma política científica de estado e qualquer que seja sua orientação política (direita, centro-direita, centro, centro-esquerda ou de esquerda), jamais concordará com tamanha insanidade. Isso não é compatível com um mundo globalizado, onde um povo sem C&T passará a ser na prática os verdadeiros indígenas do século XXI. Nossos ancestrais Pré-colombianos, apesar da cultura vigorosa enquanto visão filosófica do mundo, foram aniquilados devido ao desconhecimento da ciência e da técnica dos “bárbaros europeus”.
Aprendi numa Universidade Federal Nordestina, que nós docentes das Universidades Públicas Brasileiras temos o dever para com o nosso povo de alavancar e defender as conquistas do País na área de recursos humanos para C&T. Somos nós professores das Universidades Federais, juntamente com as Estaduais e os institutos de Pesquisa do MCT, que entendemos mais claramente a sua importância. Portanto, somos os interlocutores naturais dessa inter-relação simbiótica entre Ciência e Desenvolvimento1.
No meu entender, não podemos permitir que a ANDES continue pressionando o governo a passar essa carreira. Continuar a greve agora tendo a carreira unificada como uma das justificativas é uma espécie de marcha da insensatez. Não podemos seguir essa rota. Essa carreira é ruim para as Universidades e para o País.
Sua defesa é muito interessante para a ANDES que provavelmente passará a representar quase todo o magistério da União. Isto representará milhares de novos associados extremamente fiéis, oriundos dos ensinos básico e médio.  Naturalmente, um grande  número de associados representa poder para turbinar ações políticas. Portanto, é até compreensível que isso seja buscado. No entanto, é preciso cautela e muito cuidado na ação política concreta.  Ter grande representatividade não implica necessariamente numa defesa positiva das Universidades Federais e muito menos da Nação como um todo enquanto Estado imerso nesse mundo globalizado e mutante.
NÃO acredito que o Governo Federal reabra negociações para discutir uma carreira que prejudique as Universidades Federais e seu parque científico e tecnológico obtido a custas do suor e do trabalho do povo brasileiro e de pesquisadores experientes que foram beneficiados por uma política de sucesso (CAPES-PICD/CNPq),  cuja  implementação foi iniciada há cerca de 40 anos atrás (1974)2.
Mais ganhos salariais? Até poderia ser, mas não nessa conjuntura de crise, onde professores Universitários europeus estão diminuindo o salário e a carreira docente no Brasil se tornando cada vez mais valiosa e atrativa para estrangeiros. Obtivemos ganhos reais. Contando de Adjunto I até Titular, por exemplo, o acordo garante entre 31% e 40%. O MEC e seus auxiliares sabem que os melhores pesquisadores deste País estão ocupados demais com a própria pesquisa para lutarem ou cuidarem dos interesses das novas gerações  e,  portanto, não estão participando dessa greve (a maioria até porque já fizeram uma carreira!).  Além disso, já temos uma carreira compatível com a modernidade.
Graças ao nosso movimento não teremos a partir de agora concurso para professor Titular (Ver Acordo em anexo, Acordo.pdf). A passagem para o último nível virá através de progressão como no mundo inteiro.  A única exceção  é a  reserva dos 5%, a qual será esporadicamente utilizado para criação de uma nova área de pesquisa, o que é bastante salutar. Apenas neste caso um professor externo poderá se candidatar. Esse foi um dos ganhos da greve que a ANDES insiste em não reconhecer.
Acredito que deveríamos agora organizar a saída, pois não existem mais vantagens a serem conquistadas. Creio também que nós docentes das Universidades Federais precisamos tercoragem suficiente para dizer a ANDES que não queremos participar da Carreira Unificada. Tudo bem que proponham uma nova carreira docente (mais decente) para os ensinos básico, médio, técnico e tecnológico a nível federal. Isso é justo, urgente e necessário, pois servirá de exemplo para a educação que queremos para nossos filhos. Mas a carreira Acadêmica existente é adequada e já segue o padrão internacional.  Precisamos de 2 carreiras pois os objetivos são distintos. Temos também a certeza que nossos alunos já foram demasiadamente penalizados com essa greve, tendo como pano de fundo a construção de um grande mito: A Carreira Unificada.  Não poderia dar certo3.
Rose Clívia Santos – Profa. Adjunto I
UNIFESP – Campus Diadema
1Nesse sentido seria interessante estimular os alunos a lerem o livro do Físico brasileiro Leite Lopes – Ciência e Libertação (1968), ou ainda Ciência e Desenvolvimento do Físico e Filósofo da Ciência argentino Mario Bunge (Itatiaia, 1980), isto para citar apenas autores latino americanos. Embora antigos e, portanto, com alguns temas atuais não discutidos (ex. biodiversidade, fontes alternativas de energia, clima, etc), creio que a leitura deles ajudará os estudantes a perceberem o nosso contexto, evitando no futuro descaminhos que nos reconduzam ao atraso.
2Sobre as políticas da CAPES ver o texto recente de Angela Santana e Humberto Falcão Martins (2012) denominado,  “Gestão Estratégica e Políticas Públicas: A CAPES e a Política de Formação de Recursos  Humanos para o Desenvolvimento do País”.
3Esclareço que não sou filiada a partidos, nem a ANDES e nem ao PROIFES.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

O Nascimento da UFCG

Hoje, dia do aniversário de dez anos da UFCG, publico o terceiro post sobre a história da Instituição (acesse As origens da UFCG e O salto quântico da UFPB). Para a construção deste texto, vali-me de minhas lembranças sobre o processo e dos documentos disponíveis no portal da UFCG (que serão referenciados posteriormente). Contei também com informações de Thompson Mariz e José Edílson Amorim (os quais entrevistei sobre o assunto em maio de 2009) e Bráulio Maia Júnior, Wagner Braga Batista e Hermano Nepomuceno, com quem conversei nesta semana sobre a criação da UFCG. Agradeço a todos, eximindo-os, evidentemente, de qualquer responsabilidade sobre as ideias aqui expostas.


Corriam os anos noventa. Findo o ciclo discricionário das ditaduras militares na América Latina que, depois de trucidarem as liberdades democráticas no continente, deixaram como saldo a chamada “década perdida” – os anos de profunda estagnação econômica, retração da atividade industrial, amplo desemprego, perda do poder de consumo da população, hiperinflação, dívida externa galopante e a própria queda do Produto Interno Bruto – os governos neoliberais, então hegemônicos, elegeram o déficit público como o grande vilão a ser combatido.
De fato, como em outros momentos críticos da história dos países emergentes, os governos gastavam muito mais do que arrecadavam, e a solução encontrada pelos neoliberais foi o estabelecimento do chamado “Estado mínimo”, isto é, a implantação de uma estrutura estatal puramente gerencial, o que enxugaria os gastos do governo, superando a crise em que os países estavam mergulhados. Entre as tantas consequências desse processo, o que não cabe aqui analisar, o impacto nas universidades federais foi o chamado “processo de sucateamento”, constituído pela drástica redução do financiamento em custeio e capital para as IFES e pelo arrocho salarial, gerando um período extremamente conturbado, entrecortado por greves frequentes e periódicas.
Foi nesse contexto que a UFCG seria gestada, embora não possamos deixar de citar a iniciativa pioneira do deputado Otacílio Nóbrega de Queiroz, que ao apresentar um projeto de Lei em 1975 com a proposta de criação da Fundação Universidade Federal de Campina Grande - que seria formada pela fusão do Campus II da UFPB com a Universidade Regional do Nordeste, predecessora da UEPB – inscreveu o designativo pela primeira vez nos Anais da República. Também não devemos esquecer que ele mesmo reeditaria a propositura em 1984, a qual, com um substitutivo do deputado Aluízio Campos incluindo os campi do Sertão, seria amplamente discutida na cidade e no Campus II, já então com a Associação dos Docentes (ADUF) participando ativamente dos debates. Ainda devemos citar a propositura de igual teor do deputado Evaldo Gonçalves, em 1989, mas, embora sejam iniciativas históricas dignas de nota, esses projetos tiveram muito pouca repercussão no Congresso Nacional e nos governos de então.
Assim, a “gestação” da UFCG começaria efetivamente em 1992, em pleno governo Collor, com a misteriosa nomeação de uma comissão da Secretaria Nacional de Educação Superior do MEC (SENESU), então dirigida por Eunice Durham, para fazer um “estudo de viabilidade” sobre o desmembramento da UFPB. Segundo os documentos alusivos à criação da UFCG publicados no portal da instituição, “a comissão concluiu seu trabalho recomendando o desmembramento, adiantando inclusive que sua consecução não implicaria em acréscimos significativos de despesas”. Ora, para um governo que cortou drasticamente o orçamento das IFES, chegando a uma redução total de 39% no último ano de seu interrompido e malfadado mandato [1], que não criou nenhuma nova universidade federal e que ainda investiu pesadamente na tese da privatização do ensino superior, isso soa muito esquisito.
Pode-se supor, portanto, que esta teria sido uma articulação do então senador Raimundo Lira, que rompera com o PMDB ao anunciar seu apoio a Fernando Collor de Melo em 1989 e se tornara, já então no PFL, coordenador da campanha de Collor na Paraíba, ao lado de seu ex-desafeto Tarcísio Burity [2]. Na época da nomeação da comissão, Lira cumpria o sexto ano de mandato, se preparava para a campanha de reeleição e, certamente, a criação da UFCG seria um bom capital político. Aliás, os jornais da época demonstram o ativíssimo engajamento do senador nessa luta. Mas... o impeachment de Collor viria a abortar os dois projetos: nem a UFCG foi criada e nem Lira reeleito.
De qualquer maneira, o projeto que fora lançado oficialmente, com a chancela de um relatório favorável do MEC e que mobilizara a cidade em torno da ideia, recolocava concretamente a possibilidade de se criar a UFCG por desmembramento da UFPB. Três eram os fatores que convergiam para essa possibilidade.
Em primeiro lugar, certo sentimento de exclusão em relação ao centro de decisões da universidade, pois, embora próximo geograficamente, o Campus II encontrava-se distante geopoliticamente do gabinete do reitor. Em decorrência disso, criticava-se o “gigantismo” da universidade como elemento de dificuldade operacional que desfavorecia os campi fora de sede [3].
Em segundo lugar, uma insatisfação com a partilha dos recursos humanos e orçamentários na Universidade, pois cabia ao Campus II apenas 25% do orçamento geral, quando este detinha 27% dos professores da UFPB, um Hospital Universitário e uma infraestrura complexa [4]. Ademais, apenas 22% dos servidores técnico-administrativos da UFPB eram lotados no Campus II, para darem conta das atividades do Hospital Alcides Carneiro, biblioteca, restaurante universitário, residência universitária, subprefeitura, creche, NPD, a mina escola, centros e departamentos do campus, bem como de assuntos comuns aos outros cinco campi fora de sede por meio da Pró-Reitoria de Assuntos do Interior (PRAI),  sediada em Campina Grande [5].
Finalmente, mas não menos importante, havia uma identidade fortemente arraigada na tradição de excelência do Campus II - cujo símbolo supremo era pós-graduação do CCT - e na própria história de protagonismo da cidade de Campina Grande, o que levava ao desejo de criação da UFCG, dando aos campinenses a oportunidade de conduzirem os próprios destinos de um Campus que possuía uma estrutura administrativa e acadêmica compatível com qualquer universidade federal do país. De fato, numa área construída de 70 mil metros quadrados, em 1996, 3.904 alunos estavam matriculados em vinte cursos de graduação, 378 em dez cursos de mestrado e 52 em dois cursos de doutorado (2/3 do total de doutorandos da UFPB) [6]. Considerando a classificação atual da CAPES [7], o Campus II desenvolvia ensino, pesquisa e extensão em sete das nove áreas de conhecimento (Ciências Exatas e da Terra, Engenharias, Saúde, Ciências Agrárias, Ciências Humanas, Ciências Sociais Aplicadas e Linguística, Letras e Artes), contava com 17 grupos de extensão, 36 grupos de pesquisa consolidados e 183 bolsas de iniciação científica [8]. Ademais, os professores do Campus II tinham uma qualificação acima da média da UFPB, com 15,58% de doutores (contra 14,52%), 44,76% de mestres (contra 43,8%) e 39,66% de graduados/especialistas (contra 43,8%) [9].
Entretanto, antes e depois do reitorado de Lynaldo Cavalcanti (1976-1980), todos os reitores da UFPB eram professores lotados em João Pessoa e Campina Grande sequer lograva emplacar um vice-reitor. Mas, no início dos anos 90 começava a ascensão política de um ativo grupo de professores do CCT que redundaria na eleição de Roberto Siqueira, do Departamento de Engenharia Elétrica, como vice-reitor de Neroaldo Pontes e, depois, de Marcos Brasileiro e Thompson Mariz, respectivamente, como vices nos dois mandatos de Jáder Nunes. Foi esse grupo, motivado por parlamentares que asseguravam que o ministro da Educação estaria receptivo à criação da UFCG [10] que recolocou a questão em pauta, através de uma carta dirigida ao reitor em 30 de março de 1995, na qual o então Pró-Reitor de Assuntos do Interior, professor Jorge Beja, secundado pelos diretores e vice-diretores de centro do Campus II, posicionavam-se favoravelmente à ideia [11]. Em resposta a essa articulação, o reitor nomeou uma “Comissão de Desmembramento da UFPB”, tendo ele próprio como presidente, Roberto Siqueira como vice e Thompson Mariz como secretário, para promover discussões na comunidade universitária e construir um anteprojeto para tal fim.
O debate não foi pacífico, pois duas teses foram discutidas acaloradamente durante os oito meses em que a comissão trabalhou. De um lado, as lideranças do CCT defendiam a criação da UFCG como uma estratégia de aperfeiçoamento gerencial, argumentando que o “gigantismo” da instituição emperrava o seu desempenho. Por outro lado, as lideranças do CH e da ADUF argumentavam que a divisão da universidade a fragilizaria no contexto do “sucateamento” que assolava as IFES em função do “ajuste neoliberal” empreendido pelos governos Collor e FHC. Os campi do sertão (Patos, Sousa e Cajazeiras) tomaram uma posição salomônica: em princípio eram contrários à divisão da universidade, mas concordavam com a criação da UFCG contanto que continuassem pertencendo à UFPB. No auge do processo de discussão um grupo de professores intitulado “Movimento Pró UFCG” promoveu um plebiscito extraoficial em que a tese da criação da nova universidade venceu por pequena margem de votos.
No dia 5 de fevereiro de 1996 o relatório final da Comissão de Desmembramento que concluiu haver “viabilidade na criação da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), a partir do Campus II da UFPB” [12] foi aprovado em reunião do CONSUNI realizada em Campina Grande. Ato contínuo, o reitor constituiu a Subcomissão Especial Pró-UFCG, presidida por Mário Araújo Filho (CCT), tendo como membros Virgílio Brasileiro, representando a PRAI, Lula Cabral (CH), Antonio Roberto Vaz Ribeiro (CCBS) e Gilberto Silva de Siqueira (HUAC). Instalada solenemente em 8 de março do mesmo ano, a subcomissão elaborou o estudo de viabilidade para a criação da UFCG [13], o qual formaria a base da exposição de motivos enviada pelo reitor ao ministro da Educação em 23 de julho de 1996 [14] e do relatório favorável da comissão do MEC, presidida por José Luis Valente [15].
E nisso ficou, não podendo ser diferente numa conjuntura em que a criação de uma nova universidade federal não passava nem de perto pelos planos do governo, já que Fernando Henrique Cardoso priorizara em sua agenda política a reforma da administração pública como a principal estratégia para o enfrentamento da crise fiscal, a consolidação da estabilização monetária e a retomada do crescimento econômico, com a “diminuição do tamanho do Estado” e um papel maior ao mercado na coordenação da economia. A reforma do Estado seria operada através de três processos: a privatização de empresas públicas, a terceirização - efetivamente realizadas - e a publicização, isto é, a transferência da gestão e prestação de serviços antes ofertado pelo Estado, como os serviços sociais – a educação e saúde, dentre outros – para o setor dito “público não-estatal”, ou terceiro setor, composto por entidades da sociedade civil de fins públicos e não lucrativos [16]. Quanto às universidades, a proposta era transformá-las em “organizações sociais”, tal como preconizaria a Lei 9.637, de 15 de maio de 1998, isto é, em fundações de direito privado, já que para o ministro Bresser Pereira, artífice da reforma, “na União os serviços não exclusivos do Estado mais relevantes são as universidades, as escolas técnicas, os centros de pesquisa, os hospitais e os museus” (Apud Alves, 2011).
Assim, a criação da Universidade Federal de Campina Grande foi postergada até o último dos oito anos do governo de Fernando Henrique Cardoso, quando, como por encanto, foram criadas cinco novas universidades federais, entre as quais a UFCG, cujo projeto de Lei de autoria do Executivo foi enviado ao Congresso Nacional, ao que tudo indica, em virtude de uma articulação do senador Ronaldo Cunha Lima.
Nascida a fórceps no final de um governo que reduziu em 21% o já então corroído orçamento das IFES [17] e em que proliferaram as instituições de ensino superior particulares em detrimento das públicas, a UFCG demonstraria que viera ao mundo num contexto adverso, mas que nascia pronta para se consolidar como instituição. Realmente, quando ventos melhores sopraram para as Instituições Federais de Ensino Superior, a UFCG se agigantou. Mas essa é outra história.


[1] SCHWARTZMAN, Jaques: Políticas de Ensino Superior no Brasil na década de 90. O financiamento das Universidades Federais. Trabalho apresentado na XIXª Reunião Anual da ANPED. Caxambu, 1996. Acesse aqui
[2] Segundo matéria do site Lana Caprina. Acesse aqui
[3] Universidade Federal de Campina Grande: elementos para sua criação, p. 4. Campina Grande, UFPB, 1996. Acesse aqui
[4] Proposta de Criação da Universidade Federal de Campina Grande. João Pessoa, UFPB, 1996. Acesse aqui
[5] Proposta de Criação da Universidade Federal de Campina Grande. João Pessoa, UFPB, 1996. Acesse aqui
[6] Relatório da Comissão do MEC sobre a viabilidade da criação da UFCG. Campina Grande, UFPB/PRAI, s/d. Acesse aqui
[8] Relatório da Comissão do MEC sobre a viabilidade da criação da UFCG. Campina Grande, UFPB/PRAI, s/d. Acesse aqui
[9] Proposta de Criação da Universidade Federal de Campina Grande. João Pessoa, UFPB, 1996. Acesse aqui
[10] Universidade Federal de Campina Grande: elementos para sua criação, p. 7. Campina Grande, UFPB, 1996. Acesse aqui
[11] Universidade Federal de Campina Grande: elementos para sua criação, p. 7. Campina Grande, UFPB, 1996. Acesse aqui
[12] Universidade Federal de Campina Grande: elementos para sua criação, p. 8. Campina Grande, UFPB, 1996. Acesse aqui
[13] Universidade Federal de Campina Grande: elementos para sua criação. Campina Grande, UFPB, 1996. Acesse aqui
[14] Proposta de Criação da Universidade Federal de Campina Grande. João Pessoa, UFPB, 1996. Acesse aqui
[15] Relatório da Comissão do MEC sobre a viabilidade da criação da UFCG. Campina Grande, UFPB/PRAI, s/d. Acesse aqui
[16] ALVES, Flávia de Freitas. A reforma do Estado nos anos 90 e sua influência na autonomia das Universidades Federais Brasileiras. Trabalho apresentado no 25º Simpósio Brasileiro e 2º Congresso Ibero-Americano de Política e Administração da Educação. São Paulo, ANPAE, 2011. Acesse aqui
[17] Amaral, Nelson Cardoso. “Autonomia e financiamento das IFES: desafios e ações”. Avaliação. Campinas; Sorocaba, SP, v. 13, n. 3, p. 647-680, nov. 2008. Acesse aqui


Entrevista no Programa Opinião - TV Borborema