Mostrando postagens com marcador Universidade Camponesa. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Universidade Camponesa. Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 19 de maio de 2011

MEC destaca Projeto de Extensão da UFCG

Transcrevo abaixo matéria de Ionice Lorenzoni divulgada na página eletrônica do MEC sobre o Projeto Fogão Solar, executado pela equipe do Projeto UniCampo.

Um projeto de extensão da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), no campus do município de Sumé, no Cariri paraibano, ensinou 81 famílias de dois assentamentos da reforma agrária a construir um tipo de fogão solar e a cozinhar. Economia de tempo e de trabalho das mulheres, de consumo de lenha e carvão, proteção do meio ambiente são pontos de destaque do projeto.
Para o diretor do campus, Márcio Caniello, o repasse de conhecimentos e de tecnologias e a interação com as comunidades são deveres da universidade. “Nossa missão é promover o desenvolvimento da Paraíba com projetos de extensão e pesquisa”, diz. O campus começou funcionar em julho de 2009 e integra o programa de expansão das universidades federais do Ministério da Educação.
Em fevereiro e março deste ano, professores e estudantes da unidade da UFCG em Sumé realizaram quatro oficinas sobre o fogão solar com agricultores dos assentamentos Novo Mundo, no município de Camalaú, e Serrote Agudo, município de Prata. 
Nas oficinas, explica a diretora do projeto, Luciana Cantalice, as famílias receberam informações sobre modos de proteger o meio ambiente com práticas simples como substituir parte do cozimento das refeições com o uso da energia solar. No Nordeste, diz o professor Caniello, a lenha é significativa na matriz energética. Substituir seu uso, pelo menos em parte, tem impacto positivo na vida das comunidades e na preservação.
Desconfiança. Essa foi a reação imediata dos assentados na possibilidade efetiva de cozinhar com o calor do sol, mas a experiência deles mostrou que é viável, diz a diretora. A tecnologia do fogão solar que chegou ao Cariri paraibano foi desenvolvida pelo professor Olívio Teixeira, da Universidade Federal de Sergipe, e repassada ao campus de Sumé. 
O fogão é feito com duas caixas de papelão de 60 x 60 centímetros, embutidas, altura de 40 centímetros, uma chapa de zinco pintada de preto fosco que fica no fundo da caixa, papel alumínio para revestimento interno, cola, fita adesiva e um vidro para cobrir. O custo unitário é de R$ 65,00. Em 2010, o campus de Sumé recebeu R$ 50 mil do Banco do Nordeste para executar o projeto nos dois assentamentos.
De acordo com Luciana Cantalice, nas oficinas os agricultores receberam o conjunto de materiais do fogão solar adquirido pela universidade e aprenderam a montá-lo. Nos assentamentos Novo Mundo e Serrote Agudo, 81 famílias fizeram os fogões, aprenderam a usá-los e aprovaram a tecnologia. Se não ficar exposto à chuva e ao sereno, a duração do fogão é de dois anos.
120 graus – O fogão exposto ao sol do Cariri alcança 120 graus centígrados e demora um pouco mais que na cozinha convencional para preparar os alimentos, mas dispensa cuidados como manter o fogo aceso com lenha ou carvão ou controlar o gás de botijão. Para cozinhar, os alimentos são colocados na caixa em panela fechada com tampa e para assar, em assadeira.
Na experiência dos assentamentos do Cariri, o arroz cozinha em 1h30, o feijão verde em 2h30, o peixe assa em 1h30, a carne bovina ou de bode em 2h30. E não queima os alimentos, explica a diretora. Depois das primeiras desconfianças nas possibilidades do fogão, Luciana diz que as mulheres se entusiasmaram com o projeto e começaram a assar bananas, pães, bolos. Deu certo e hoje a comunidade está reunindo receitas que vai divulgar em livro com apoio do campus.
Com temperatura média anual de 25 a 27 graus centígrados, 2.800 horas de sol por ano, chuvas escassas, a população rural do Cariri paraibano pode usar a tecnologia do fogão solar com vantagem, explica Márcio Caniello. Em 2011, o campus vai apresentar novo projeto ao Banco do Nordeste na tentativa de obter mais recursos para replicar o fogão solar em outros assentamentos.
Longe da capital – A universidade chegou à região há dois anos, tem 788 estudantes em cursos superiores de graduação, dos quais 75% são do Cariri e 90% deles da Paraíba. A criação da unidade da UFCG em Sumé faz parte da primeira fase de expansão das universidades federais promovida pelo Ministério da Educação, a partir de 2005. 
O município de Sumé, com 16 mil habitantes segundo o censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010, fica a 130 quilômetros de Campina Grande, onde está a sede da universidade, e a 264 quilômetros de João Pessoa, a capital do estado. O Cariri paraibano, que ocupa o sul do estado, reúne 29 municípios onde vivem 160 mil pessoas. 

Ionice Lorenzoni

domingo, 15 de maio de 2011

Mais Escolas Agrotécnicas para o Nordeste

Segundo dados do último censo, há cerca de 30 milhões de pessoas vivendo no campo no Brasil, quase a metade delas concentradas na região Nordeste, que possui uma população rural de 14,3 milhões de pessoas, constituindo-se, assim, na região com o maior percentual de população nessa condição de domicílio. Isto é, 26,9% dos nordestinos vivem no campo.
No que tange à estrutura etária da população, o Nordeste ainda tem características de uma população jovem, segundo o IBGE. Embora os níveis de fecundidade tenham caído pronunciadamente a partir da década de 1980, o que provocou uma drástica redução no grupo de crianças menores de 5 anos, a população em idade escolar ainda é bastante significativa, representando 38% do total, mais de 20 milhões de crianças e jovens.
Ainda não foram divulgados todos os dados sobre a escolaridade dos brasileiros, mas, em relação ao analfabetismo, mais uma vez a região Nordeste é o destaque negativo no censo, pois apresenta hoje uma taxa de 19,1% de analfabetos na população acima de 15 anos, muito próxima à do Brasil em 1991 (20,1%). Isto é, em termos de combate ao analfabetismo, o Nordeste apresenta uma defasagem de 20 anos em relação à média nacional. Quando comparamos regionalmente, a discrepância é ainda mais gritante: hoje a região Sul apresenta uma taxa de analfabetismo de 5,1%, a menor do Brasil, seguida pelo Sudeste (5,5%), Centro-Oeste (7,2%) e Norte (11,2%). Assim, a taxa de analfabetismo no Nordeste é cerca de quatro vezes maior do que no Sul e Sudeste e quase o dobro da região Norte.
Ademais, sabe-se que apesar do aumento do número de estabelecimentos que oferecem o nível médio nas comunidades rurais verificado pelos censos escolares realizados pelo INEP/MEC nos últimos anos (de 679 em 2000 para 2.173 em 2009), sua oferta se encontra ainda longe da universalização, assim como a oferta dos anos finais do ensino fundamental. Em relação ao ensino profissionalizante, a situação é ainda mais grave, pois, no Brasil apenas 4% dos estabelecimentos que oferecem este tipo de ensino estão implantados na zona rural. No Nordeste, são 6%[1].
Esta situação requer, evidentemente, uma política de expansão da oferta de educação de qualidade para os povos do campo, notadamente no Nordeste, a região mais rural e a segunda mais jovem do Brasil. Por outro lado, não basta apenas oferecer ensino propedêutico para os jovens do campo nordestinos, pois muitos deles estão dispostos a dar continuidade aos empreendimentos rurais de seus pais e avós, o que se pode verificar pela significativa presença de jovens agricultores familiares na dinâmica do Programa Territórios da Cidadania na região.
De fato, o Projeto Universidade Camponesa (UniCampo), ação de extensão que a Universidade Federal de Campina Grande desenvolve desde 2003, tem demonstrado que projetos educacionais voltados para uma formação técnica focada nas novas tecnologias sustentáveis para a agropecuária no Semiárido são muito bem vindos entre os jovens agricultores familiares[2], pois além de lhes conferirem auto-estima e “empoderamento”, abrem reais oportunidades para que assumam o empreendimento familiar, renovando-o e revitalizando-o[3].
Os trabalhos desenvolvidos ao longo da experiência do Projeto Unicampo convenceram os participantes de que, malgrado as extremas vulnerabilidades ambientais, sociais, políticas e econômicas do Bioma Caatinga, o Semiárido brasileiro é um lugar pleno de possibilidades de existência digna para os camponeses. Assim, os trabalhos demonstraram a capacidade coletiva de produção de conhecimentos para melhor se identificar estas potencialidades e valorizá-las num projeto renovado de desenvolvimento sustentável.
Este conjunto de repercussões positivas levou a UFCG a criar um Campus da Instituição em Sumé, na região do Cariri paraibano, fundamentado nas perspectivas político-pedagógicas do Projeto Universidade Camponesa, inaugurado em setembro de 2009. No referido campus, onde funciona o Centro de Desenvolvimento Sustentável do Semiárido, é oferecido o Curso Superior de Tecnologia em Agroecologia, que institucionalizou definitivamente os princípios pedagógicos da UniCampo, bem como um Curso de Licenciatura em Educação do Campo, voltado à formação de professores para a zona rural.
Mas, além da ampliação do acesso ao ensino superior para os jovens rurais e o desenvolvimento de projetos de extensão que promovam sua inclusão educacional, é preciso investir na ampliação da oferta de ensino básico profissionalizante através da implantação de escolas agrotécnicas em toda a região.
Penso ser esta uma ação estratégica para o próprio desenvolvimento sustentável do Nordeste brasileiro, a região mais rural e a segunda mais jovem do Brasil, uma vez que a formação de mão de obra especializada pode reduzir o êxodo campo-cidade ao abrir novas oportunidades de emprego e renda para esses milhões de jovens empreendedores do campo, dinamizando o sistema produtivo agropecuário na região e revigorando a agricultura familiar nordestina pelas mãos dos jovens camponeses.

[1] Sinopse Estatística da Educação Básica, 2009. Brasília, MEC/INEP, 2010.
[2] Ver, por exemplo, "As boas sementes do Cariri paraibano”. Revista Problemas Brasileiros, Ano XLVII, Nº 392, março/abril de 2009 (http://migre.me/4xTC6).
[3] LEAL, Fernanda, CANIELLO, Márcio, TONNEAU, Jean-Philippe. “Projeto UniCampo: uma experiência de extensão no Cariri paraibano”. In: CORRÊA, E. J., CUNHA, E. S. M. e CARVALHO, A. M. (Orgs.). (Re)conhecer diferenças, construir resultados. 1ª ed. Brasília: UNESCO, 2004, pp. 209-217 (www.ufcg.edu.br/~unicampo/textos.htm); DUQUÉ, Ghislaine, CANIELLO, Márcio e TONNEAU, Jean-Philippe. “Lideranças Camponesas da UniCampo: processo de empoderamento”. In: Anais da VI Reunião de Antropólogos do Mercosul. Montevidéu - Uruguai, 2005. COUDEL, Emilie. Formation et apprentissages pour le développement territorial : regards croisés entre économie de la connaissance et sciences de gestion. Réflexion à partir d’une expérience d’Université Paysanne au Brésil. Tese de Doutorado. Montpellier, SUPAGRO, 2009 (www.supagro.fr/theses/extranet/09-0003_Coudel.pdf).